Fracionamento de Férias Após a Reforma Trabalhista: O Que Mudou?

21 de novembro de 2025

Compartilhe:

FRACIONAMENTO DE FÉRIAS APÓS A REFORMA TRABALHISTA: O QUE MUDOU?

Introdução

As férias anuais remuneradas representam um dos mais importantes institutos do Direito do Trabalho, destinando-se não apenas ao descanso físico do empregado, mas também à sua recuperação psicológica e reinserção no contexto familiar e social. Tradicionalmente, a legislação trabalhista brasileira privilegiou a concessão de férias em período único e contínuo de trinta dias, partindo da premissa de que o descanso fragmentado comprometeria a efetividade dos objetivos protetivos do instituto.

Esta concepção, embora tecnicamente fundamentada em considerações médicas e sociais sobre a necessidade de recuperação integral do trabalhador, mostrou-se progressivamente desafiada pela realidade operacional de diversos setores econômicos e pelas próprias demandas de parcela significativa dos empregados. Empresas que enfrentam sazonalidades produtivas, necessidades de manutenção de níveis adequados de pessoal durante todo o ano, ou características operacionais específicas, frequentemente deparavam-se com dificuldades para conciliar a concessão de férias de trinta dias corridos com a continuidade de suas atividades.

Simultaneamente, trabalhadores manifestavam interesse crescente em distribuir seu período de descanso ao longo do ano, seja para acomodar compromissos familiares específicos, adequar-se a períodos de férias escolares de filhos, ou simplesmente por preferência pessoal por períodos de descanso mais frequentes e menos extensos. Este cenário de tensão entre a rigidez normativa e as demandas práticas de empregadores e empregados constituiu um dos fatores que motivaram a reforma trabalhista promovida pela Lei 13.467, de 13 de julho de 2017.

A reforma introduziu alterações substanciais no regime de fracionamento de férias, flexibilizando significativamente as regras anteriores e conferindo maior autonomia às partes da relação de emprego para definirem, dentro de limites legais, a forma de fruição do descanso anual. O presente artigo examina detidamente estas mudanças, analisando o regime jurídico anterior, as novas regras estabelecidas pela reforma, os requisitos para o fracionamento, as vedações legais aplicáveis, e as implicações práticas destas alterações tanto para empregadores quanto para trabalhadores.


O Regime Anterior à Reforma Trabalhista

Antes das alterações promovidas pela Lei 13.467/2017, o artigo 134 da Consolidação das Leis do Trabalho estabelecia que as férias deveriam ser concedidas por ato do empregador, em um só período, nos doze meses subsequentes à data em que o empregado houvesse adquirido o direito. A regra geral era, portanto, a concessão integral e contínua de trinta dias de férias, sem possibilidade de fragmentação.

Esta sistemática fundamentava-se na compreensão de que o descanso anual cumpre funções biológicas e sociais que exigem período mínimo de afastamento contínuo para sua efetividade. Do ponto de vista fisiológico, argumentava-se que a recuperação completa das energias físicas e mentais do trabalhador, especialmente em atividades que envolvem desgaste significativo ou exposição a riscos ocupacionais, demandaria período prolongado de descanso. Do ponto de vista social, sustentava-se que a reinserção do empregado no contexto familiar e comunitário, com participação efetiva em atividades de lazer, cultura e convivência, pressupunha disponibilidade temporal mais extensa.

Excepcionalmente, o parágrafo primeiro do artigo 134, em sua redação original, permitia o fracionamento das férias, mas apenas em casos considerados excepcionais e mediante concordância do empregado. Mesmo nestas hipóteses excepcionais, vedava-se que qualquer dos períodos fracionados fosse inferior a dez dias corridos. A doutrina e a jurisprudência interpretavam restritivamente esta possibilidade de fracionamento excepcional, exigindo a demonstração de circunstâncias específicas que justificassem o afastamento da regra geral.

Consideravam-se excepcionais, para fins de autorizar o fracionamento, situações como necessidades operacionais inadiáveis da empresa que inviabilizassem o afastamento prolongado de determinado empregado, solicitação fundamentada do próprio trabalhador por razões pessoais relevantes, ou características específicas da atividade desenvolvida que tornassem mais adequada a divisão do período de descanso. Em qualquer caso, a concordância expressa do empregado era indispensável, e a autoridade fiscalizadora poderia questionar a regularidade do fracionamento quando ausentes circunstâncias efetivamente excepcionais.

Este regime, embora garantisse proteção robusta ao trabalhador e preservasse a efetividade do instituto das férias, gerava dificuldades práticas significativas. Empresas com quadros funcionais reduzidos, atividades que exigiam continuidade operacional, ou setores sujeitos a variações sazonais de demanda, frequentemente encontravam obstáculos para conceder férias de trinta dias corridos sem comprometimento de suas operações. Trabalhadores, por sua vez, nem sempre conseguiam adequar o período único de férias às suas necessidades pessoais e familiares, especialmente quando tinham filhos em idade escolar com calendários de férias fracionados, ou quando preferiam realizar múltiplas viagens curtas ao longo do ano em detrimento de uma única viagem prolongada.


As Novas Regras de Fracionamento

A Lei 13.467/2017 promoveu alteração profunda no regime de fracionamento de férias, substituindo a excepcionalidade pela possibilidade regular, condicionada à concordância do empregado e à observância de requisitos específicos. O artigo 134 passou a estabelecer, em sua nova redação, que as férias serão concedidas por ato do empregador em um só período, nos doze meses subsequentes à data em que o empregado tiver adquirido o direito, e que, desde que haja concordância do empregado, as férias poderão ser usufruídas em até três períodos.

Esta mudança representa inversão fundamental de paradigma. O fracionamento deixa de ser exceção que demanda justificativa especial, passando a constituir possibilidade regular que as partes podem adotar sempre que houver acordo entre empregador e empregado. A lei não mais exige a demonstração de circunstâncias excepcionais, bastando a manifestação de vontade de ambas as partes e o cumprimento dos requisitos formais estabelecidos.

O parágrafo primeiro do artigo 134, em sua atual redação, estabelece três requisitos cumulativos para o fracionamento. Primeiro, sendo as férias divididas em períodos, um deles não poderá ser inferior a quatorze dias corridos. Segundo, os demais períodos não poderão ser inferiores a cinco dias corridos, cada um. Terceiro, é vedado o início das férias no período de dois dias que antecede feriado ou dia de repouso semanal remunerado.

O requisito de período mínimo de quatorze dias corridos fundamenta-se em considerações médicas e psicossociais. Estudos sobre recuperação do trabalhador e gestão do estresse ocupacional indicam que períodos inferiores a duas semanas mostram-se insuficientes para a recuperação completa das energias físicas e mentais, especialmente em atividades que envolvem desgaste significativo. O legislador reformista, embora flexibilizando o regime de férias, optou por preservar garantia mínima de período contínuo mais extenso que assegure efetividade aos objetivos essenciais do instituto.

Os demais períodos, por sua vez, devem ter no mínimo cinco dias corridos cada um. Este piso revela-se substancialmente inferior aos dez dias exigidos pela legislação anterior, ampliando significativamente as possibilidades de fracionamento. Na prática, o empregado pode dividir suas férias de diversas formas: quatorze dias em um período e dezesseis em outro; quatorze dias, dez dias e seis dias; quatorze dias, oito dias e oito dias; ou quatorze dias, cinco dias e onze dias, entre outras combinações possíveis, sempre respeitados os limites mínimos estabelecidos.

A vedação de início das férias no período de dois dias que antecede feriado ou dia de repouso semanal remunerado visa evitar que a fragmentação do descanso resulte em períodos excessivamente curtos que não cumpririam adequadamente as finalidades do instituto. Se as férias pudessem iniciar-se na véspera de um feriado ou final de semana, o empregado gozaria efetivamente de período menor do que o formalmente concedido, uma vez que os dias de feriado ou repouso já lhe seriam devidos independentemente das férias. Esta restrição aplica-se a feriados nacionais, estaduais e municipais, bem como aos dias de repouso semanal remunerado, geralmente sábados ou domingos conforme a jornada adotada pela empresa.

Comparando-se os regimes anterior e posterior à reforma, observam-se as seguintes diferenças fundamentais: o fracionamento passou de excepcional para regular; o número de períodos possíveis aumentou de dois para três; o período mínimo de cada fração reduziu-se de dez para cinco dias corridos nos períodos menores; e estabeleceu-se exigência expressa de período mínimo de quatorze dias corridos para um dos períodos, requisito que não existia anteriormente de forma explícita, embora decorresse da vedação de períodos inferiores a dez dias quando havia apenas dois períodos.


Concordância do Empregado

A concordância do empregado constitui requisito essencial e indispensável para a validade do fracionamento de férias no regime instituído pela reforma trabalhista. O caput do artigo 134 da CLT é explícito ao condicionar a divisão das férias em períodos à expressão “desde que haja concordância do empregado”, evidenciando que o fracionamento não pode ser imposto unilateralmente pelo empregador.

Esta exigência legal reflete princípio fundamental do Direito do Trabalho: a indisponibilidade de direitos trabalhistas e a necessidade de proteção da autonomia da vontade do empregado em contexto de subordinação jurídica. Embora a reforma tenha flexibilizado as regras de férias, conferindo maior espaço para a autonomia privada, preservou-se garantia essencial de que alterações no regime de fruição do descanso anual dependem de manifestação volitiva do trabalhador.

A natureza jurídica desta concordância caracteriza-se como manifestação bilateral de vontade, configurando negócio jurídico trabalhista que modifica a forma de cumprimento de obrigação legal. O empregador possui prerrogativa de escolher a época de concessão das férias, nos termos do artigo 136 da CLT, e pode propor o fracionamento quando julgar conveniente aos interesses organizacionais. Entretanto, esta faculdade patronal encontra-se condicionada à anuência do empregado, que detém direito potestativo de aceitar ou recusar a proposta de divisão do período de descanso.

Embora a lei não estabeleça forma específica para a manifestação da concordância, recomenda-se enfaticamente sua formalização por escrito. A documentação adequada previne controvérsias futuras sobre a existência ou não do consentimento, constituindo prova essencial tanto para o empregador, que demonstrará ter observado o requisito legal, quanto para eventual fiscalização do trabalho ou demanda judicial. O documento de concordância deve ser claro quanto ao fracionamento proposto, especificando as datas de início e término de cada período, e deve ser assinado pelo empregado, idealmente com antecedência razoável em relação ao início das férias.

O empregado possui direito irrestrito de recusar a proposta de fracionamento apresentada pelo empregador. Esta recusa não pode motivar qualquer forma de retaliação, discriminação ou prejuízo ao trabalhador, sob pena de configurar ato ilícito passível de responsabilização do empregador. Exercida a negativa, o empregado manterá seu direito ao gozo integral de trinta dias corridos de férias, nos termos da regra geral do artigo 134, caput.

Questão que suscita debate refere-se à validade de cláusula em acordo coletivo ou convenção coletiva de trabalho que preveja o fracionamento de férias para determinada categoria profissional. Embora a negociação coletiva possua ampla autonomia para estabelecer condições de trabalho, respeitados os direitos indisponíveis, a exigência legal de concordância individual do empregado não pode ser suprimida por norma coletiva. Assim, ainda que o instrumento coletivo autorize ou discipline o fracionamento, permanece necessária a manifestação específica de cada trabalhador quanto à divisão de suas férias, não sendo válida imposição automática baseada exclusivamente na previsão coletiva.


Vedações Legais ao Fracionamento

O parágrafo segundo do artigo 134 da CLT, introduzido pela Lei 13.467/2017, estabelece duas vedações absolutas ao fracionamento de férias, determinando que a divisão do período de descanso não se aplica aos empregados menores de dezoito anos e aos empregados maiores de cinquenta anos de idade. Estas restrições fundamentam-se em razões de proteção especial a categorias de trabalhadores que demandam tutela jurídica diferenciada.

A vedação de fracionamento para empregados menores de dezoito anos insere-se no sistema mais amplo de proteção ao trabalho do adolescente, previsto constitucionalmente e regulamentado por legislação específica. O ordenamento jurídico brasileiro reconhece que trabalhadores nesta faixa etária encontram-se em fase peculiar de desenvolvimento físico, psicológico e social, demandando condições laborais que não comprometam sua formação integral. O descanso contínuo de trinta dias mostra-se particularmente relevante para esta população, considerando-se que o trabalho precoce já representa, por si, fator de risco ao desenvolvimento saudável.

A proteção estende-se a todos os empregados menores de dezoito anos, independentemente de outras circunstâncias. Ainda que o adolescente manifeste interesse no fracionamento, ainda que haja concordância de seus responsáveis legais, e ainda que o empregador demonstre conveniência organizacional, o fracionamento permanece absolutamente vedado. Trata-se de norma de ordem pública, de caráter cogente, que não admite flexibilização por vontade das partes ou por previsão em instrumento de negociação coletiva.

A vedação de fracionamento para empregados maiores de cinquenta anos fundamenta-se em considerações relacionadas ao processo de envelhecimento e suas repercussões sobre a capacidade de recuperação do organismo. Estudos gerontológicos indicam que trabalhadores em idade mais avançada necessitam de períodos mais prolongados de descanso para recuperação plena de suas energias físicas e mentais. A fragmentação do período de férias poderia comprometer a efetividade do repouso para esta população, aumentando riscos de agravamento de condições de saúde relacionadas à idade e ao desgaste laboral acumulado.

Esta restrição etária tem suscitado debate doutrinário e social. Críticos argumentam que a vedação generalizada baseada exclusivamente na idade cronológica pode configurar discriminação etária (etarismo), desconsiderando que trabalhadores acima de cinquenta anos podem apresentar condições de saúde, capacidade física e preferências pessoais absolutamente compatíveis com o gozo fracionado de férias. Defensores da norma sustentam que a proteção legal visa assegurar tutela mínima a categoria estatisticamente mais vulnerável a problemas de saúde relacionados ao trabalho, e que a opção legislativa por critério objetivo de idade, embora generalizante, proporciona maior segurança jurídica e facilita a fiscalização.

O descumprimento destas vedações sujeita o empregador a sanções administrativas, mediante aplicação de multa por infração à legislação trabalhista, e pode ensejar questionamento judicial por parte do empregado, com eventual reconhecimento de irregularidade na concessão das férias e suas consequências jurídicas correlatas.


Aspectos Práticos do Fracionamento

A implementação do fracionamento de férias demanda atenção rigorosa a diversos aspectos procedimentais e financeiros que asseguram a regularidade da concessão e previnem questionamentos administrativos ou judiciais. O planejamento adequado, a comunicação tempestiva ao empregado, e o cumprimento de obrigações formais e pecuniárias constituem elementos essenciais da gestão das férias fracionadas.

O planejamento das férias fracionadas deve iniciar-se com antecedência suficiente para permitir a adequada programação organizacional e a comunicação tempestiva ao empregado. Recomenda-se que o empregador, ao identificar a conveniência ou necessidade de fracionamento, solicite formalmente a concordância do trabalhador com no mínimo sessenta dias de antecedência em relação ao início do primeiro período de férias. Este prazo superior ao mínimo legal de trinta dias estabelecido no artigo 135 da CLT proporciona margem para negociação, eventual recusa e reprogramação alternativa.

A comunicação ao empregado sobre cada período de férias deve observar rigorosamente o prazo de trinta dias previsto no artigo 135, aplicável a cada fração do descanso. Assim, se as férias foram divididas em três períodos, o empregador deverá comunicar formalmente ao empregado, com no mínimo trinta dias de antecedência, a data de início de cada um dos períodos. Esta comunicação deve ser realizada por escrito, mediante recibo assinado pelo trabalhador, constituindo prova documental essencial do cumprimento da obrigação legal.

As anotações pertinentes às férias fracionadas devem ser efetuadas na Carteira de Trabalho e Previdência Social do empregado e nos livros ou fichas de registro mantidos pela empresa. Cada período de férias gozado deve ser individualmente registrado, especificando-se as datas de início e término. Esta documentação detalhada facilita controles internos, possibilita fiscalização adequada pelos órgãos competentes, e constitui prova em eventual demanda judicial.

Quanto aos aspectos financeiros, o artigo 145 da CLT determina que o pagamento da remuneração das férias e do terço constitucional seja efetuado até dois dias antes do início do período de gozo. No fracionamento, surgem duas alternativas operacionais: o empregador pode efetuar pagamento específico antes de cada período fracionado, correspondente aos dias daquele período específico acrescidos do terço constitucional proporcional; ou pode optar por efetuar pagamento integral de todas as férias e do terço constitucional antes do início do primeiro período fracionado.

A primeira alternativa, embora mais complexa administrativamente por demandar múltiplos cálculos e pagamentos, distribui o impacto financeiro ao longo do ano. A segunda alternativa, de pagamento antecipado único, simplifica controles e assegura que o empregado disponha da integralidade dos recursos financeiros desde o início da fruição das férias, mas concentra o impacto no fluxo de caixa empresarial. Qualquer das alternativas mostra-se juridicamente válida, desde que observado o prazo de dois dias antes do início de cada período de férias.

O terço constitucional incide sobre a integralidade da remuneração de férias, independentemente de seu fracionamento. Assim, empregado com salário de três mil reais mensais receberá três mil reais de férias acrescidos de mil reais de terço constitucional, perfazendo quatro mil reais, seja o pagamento efetuado integralmente antes do primeiro período ou parceladamente antes de cada fração.

A conversão de um terço das férias em abono pecuniário, prevista no artigo 143 da CLT, é plenamente compatível com o fracionamento. O empregado que optar pela conversão gozará efetivamente vinte dias de férias, que poderão ser fracionados respeitados os limites legais, recebendo adicionalmente o valor correspondente aos dez dias convertidos. A combinação mais comum será quatorze dias de gozo efetivo em um período e seis dias em outro, com pagamento do abono pecuniário referente aos dez dias restantes.

Nas férias coletivas, o regime de fracionamento difere substancialmente. O artigo 139, parágrafo primeiro, da CLT estabelece que as férias coletivas poderão ser gozadas em dois períodos anuais, desde que nenhum deles seja inferior a dez dias corridos. Observe-se que o regime das férias coletivas é menos flexível que o das férias individuais, permitindo apenas dois períodos (e não três) e estabelecendo período mínimo mais elevado (dez dias em vez de cinco). Esta diferenciação justifica-se pelas peculiaridades das férias coletivas, que envolvem a suspensão de atividades de toda a empresa ou de setores específicos, demandando planejamento mais robusto e períodos mais extensos.


Boas Práticas para Empregadores e Empregados

A gestão adequada do fracionamento de férias exige a adoção de práticas estruturadas que assegurem conformidade legal, eficiência administrativa e respeito aos direitos dos trabalhadores. Tanto empregadores quanto empregados beneficiam-se da observância de procedimentos que previnam irregularidades e promovam transparência nas relações laborais.

Para os empregadores, recomenda-se primordialmente a elaboração de política interna que discipline o fracionamento de férias, estabelecendo critérios objetivos, procedimentos padronizados e responsabilidades definidas. Esta norma interna deve esclarecer as situações em que a empresa poderá propor o fracionamento, os procedimentos para solicitação da concordância do empregado, os prazos aplicáveis, e os controles administrativos necessários. A existência de política clara e transparente reduz riscos de tratamento discriminatório entre empregados e facilita a gestão uniforme da matéria em toda a organização.

A implementação de sistema informatizado de controle de férias revela-se essencial para organizações de médio e grande porte. Este sistema deve ser capaz de identificar automaticamente os períodos aquisitivos e concessivos de cada empregado, verificar o cumprimento dos requisitos legais para fracionamento (período mínimo de quatorze dias, períodos adicionais não inferiores a cinco dias, vedação de início em véspera de feriado ou repouso semanal), alertar sobre empregados menores de dezoito anos ou maiores de cinquenta anos para os quais o fracionamento é vedado, e gerar relatórios gerenciais que possibilitem o monitoramento da conformidade.

A formalização adequada da concordância do empregado constitui procedimento crítico. O empregador deve desenvolver formulário padronizado que especifique claramente os períodos propostos para cada fração das férias, indique as datas de início e término, esclareça que o empregado possui direito de recusar a proposta sem qualquer prejuízo, e contenha espaço para assinatura do trabalhador manifestando sua anuência. Este documento deve ser elaborado em duas vias, uma para o empregado e outra para arquivo da empresa, e deve ser arquivado juntamente com os demais documentos trabalhistas pelo prazo prescricional aplicável.

O cumprimento rigoroso dos prazos legais de comunicação e pagamento mostra-se fundamental. O empregador deve estabelecer controles que assegurem a comunicação formal ao empregado com no mínimo trinta dias de antecedência do início de cada período fracionado, e o pagamento da remuneração e do terço constitucional até dois dias antes de cada gozo. A violação destes prazos, embora não enseje automaticamente o pagamento em dobro das férias conforme esclarecido pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADPF 501, constitui irregularidade sujeita a sanção administrativa e pode fundamentar outras pretensões trabalhistas.

A realização de auditorias internas periódicas sobre a gestão de férias, incluindo especificamente o fracionamento, permite identificar eventuais irregularidades antes que se tornem passivos significativos. Estas auditorias devem verificar a existência de concordância formalizada para todos os casos de fracionamento, a observância dos períodos mínimos legais, o cumprimento das vedações aplicáveis a menores de dezoito anos e maiores de cinquenta anos, e a adequação dos procedimentos de comunicação e pagamento.

Para os empregados, recomenda-se criterioso exame da proposta de fracionamento apresentada pelo empregador, ponderando as vantagens e desvantagens da divisão do período de descanso em face de suas circunstâncias pessoais, familiares e de saúde. O trabalhador deve considerar se o fracionamento permitirá melhor adequação a compromissos específicos, se os períodos propostos são suficientes para a recuperação de suas energias, e se a distribuição do descanso ao longo do ano atende efetivamente a seus interesses.

O exercício do direito de recusa, quando o fracionamento proposto não atende aos interesses do empregado, deve ser feito de forma respeitosa mas firme, preferencialmente por escrito, esclarecendo que se trata de direito legalmente assegurado. O empregado não deve sentir-se pressionado a aceitar o fracionamento por receio de retaliação, devendo buscar orientação jurídica especializada caso perceba qualquer forma de constrangimento ou ameaça relacionada à sua decisão.

A documentação adequada de todos os procedimentos relacionados às férias fracionadas, incluindo a proposta do empregador, a manifestação de concordância, os recibos de pagamento, e as anotações em carteira de trabalho, deve ser preservada pelo empregado. Esta documentação constitui prova essencial de seus direitos e do cumprimento ou descumprimento de obrigações patronais, mostrando-se indispensável em eventual necessidade de questionamento judicial.


Conclusão

A reforma trabalhista promovida pela Lei 13.467/2017 introduziu mudança paradigmática no regime de fracionamento de férias, transitando de um sistema marcado pela excepcionalidade e rigidez para um modelo caracterizado pela flexibilidade regulada e maior autonomia das partes. Esta transformação reflete tentativa de conciliar a proteção jurídica ao trabalhador, materializada em requisitos mínimos e vedações específicas, com demandas de adaptabilidade às diversas realidades operacionais e preferências individuais.

A possibilidade de divisão das férias em até três períodos, respeitados os limites de quatorze dias corridos para um dos períodos e cinco dias corridos para os demais, amplia significativamente as alternativas de gestão do descanso anual. Esta flexibilização pode atender tanto a necessidades empresariais de manutenção de níveis adequados de pessoal ao longo do ano, quanto a interesses de trabalhadores que preferem distribuir seu descanso em momentos diversos, adequando-o a compromissos familiares, escolares ou pessoais.

Entretanto, a análise desenvolvida neste estudo evidencia que a flexibilização implementada pela reforma não representa desregulamentação ou supressão de proteções trabalhistas. Ao contrário, o legislador estabeleceu salvaguardas essenciais: a exigência imperativa de concordância do empregado, impedindo imposição unilateral do fracionamento; a definição de períodos mínimos que preservam tempo suficiente para recuperação adequada; a vedação absoluta de fracionamento para trabalhadores adolescentes e para empregados acima de cinquenta anos; e a proibição de início de férias em véspera de feriados ou dias de repouso, evitando fragmentação excessiva do descanso.

A implementação adequada do novo regime de fracionamento demanda atenção cuidadosa tanto de empregadores quanto de trabalhadores. Para as empresas, a gestão das férias fracionadas exige controles administrativos mais sofisticados, procedimentos de documentação rigorosos, e comprometimento com o respeito à autonomia da vontade do empregado. Para os trabalhadores, torna-se essencial a compreensão de seus direitos, a avaliação criteriosa das propostas de fracionamento em face de suas necessidades específicas, e o exercício consciente da prerrogativa de aceitar ou recusar a divisão do período de descanso.

A experiência prática dos anos subsequentes à reforma tem demonstrado que o fracionamento, quando adequadamente implementado com respeito aos requisitos legais e genuína concordância do empregado, pode constituir instrumento valioso de conciliação entre interesses organizacionais e individuais. Entretanto, os riscos de utilização inadequada do instituto, mediante pressão sobre trabalhadores para aceitação de fracionamentos contrários a seus interesses ou mediante descumprimento de requisitos formais e materiais, reforçam a importância da fiscalização trabalhista e da atuação de sindicatos na defesa dos direitos dos empregados.

A complexidade das situações práticas envolvendo férias fracionadas, especialmente quando combinadas com abono pecuniário, antecipação de décimo terceiro salário, ou inseridas no contexto de férias coletivas, recomenda enfaticamente a busca de assessoria jurídica especializada tanto por empregadores quanto por trabalhadores. O Direito do Trabalho, marcado por constantes transformações legislativas e jurisprudenciais, exige interpretação atualizada e tecnicamente fundamentada que assegure a correta aplicação das normas e a efetiva proteção dos direitos de todas as partes envolvidas.

O equilíbrio entre flexibilidade e proteção, objetivo declarado da reforma trabalhista em matéria de férias, somente se concretiza mediante comprometimento institucional com a legalidade, respeito mútuo entre empregadores e empregados, e valorização do diálogo como instrumento de construção de soluções adequadas às especificidades de cada relação de trabalho. A gestão responsável do fracionamento de férias representa, assim, não apenas cumprimento de obrigação legal, mas também investimento em relações laborais sustentáveis, produtivas e pautadas pela dignidade humana do trabalhador.

Leia também

https://www.barbieriadvogados.com/perda-do-direito-a-ferias-hipoteses-legais/

https://www.barbieriadvogados.com/ferias-e-afastamentos-impactos-no-periodo-aquisitivo/

https://www.barbieriadvogados.com/ferias-proporcionais-calculo-e-rescisao/

https://www.barbieriadvogados.com/abono-pecuniario-de-ferias-conversao-requisitos-e-calculo/

https://www.barbieriadvogados.com/ferias-coletivas-planejamento-requisitos-e-aspectos-legais/

Sobre o Autor

Maurício Lindenmeyer Barbieri é sócio da Barbieri Advogados. Mestre em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), inscrito na Ordem dos Advogados da Alemanha (RAK Stuttgart, nº 50.159), na Ordem dos Advogados de Portugal (OAB Lisboa, nº 64443L) e Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/RS nº 36.798, OAB/DF nº 24.037, OAB/SC nº 61.179-A, OAB/PR nº 101.305, OAB/SP nº 521.298), membro da Associação de Juristas Brasil Alemanha