AVC e INSS: Sequela garante Auxílio-Doença ou Aposentadoria?

AVC e INSS: Sequela garante Auxílio-Doença ou Aposentadoria

10 de novembro de 2025

Compartilhe:

A ligação telefônica chega ao escritório sempre com o mesmo tom de urgência. 

Do outro lado da linha, um familiar relata que o segurado sofreu um AVC há três semanas, permanece com sequelas significativas e não sabe se tem direito a algum benefício previdenciário

A dúvida é legítima e a resposta exige análise cuidadosa da situação concreta.

O Acidente Vascular Cerebral (AVC), classificado pelo código I64 na CID-10 e pelo código 8B20 na CID-11, representa uma das principais causas de afastamento do trabalho no Brasil. 

Dados do Ministério da Saúde indicam que o AVC atinge milhares de brasileiros anualmente, deixando sequelas que variam de leves limitações motoras até incapacidade total e permanente.

A questão central não é se o diagnóstico de AVC, por si só, garante benefício previdenciário. O elemento determinante é a existência e extensão das sequelas incapacitantes decorrentes do acidente vascular

Essa distinção orienta toda a análise jurídica dos casos.

Neste artigo, portanto, você ficará por dentro de quais direitos previdenciários uma pessoa que sofreu AVC e ficou com sequelas pode ter acesso.

Vamos ao que interessa? Confira os tópicos abaixo. 

AVC dá direito a auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez?

Depende! O sistema previdenciário brasileiro estrutura a proteção social com base na incapacidade para o trabalho, não no diagnóstico isolado. 

Um segurado pode sofrer um AVC e recuperar-se completamente, sem sequelas que impeçam suas atividades profissionais. 

Neste caso, não haverá direito a nenhum benefício por incapacidade.

O acidente vascular cerebral manifesta-se principalmente de duas formas: 

  1. AVC isquêmico: vasos sanguíneos cerebrais são obstruídos;
  2. AVC hemorrágico: resultante do rompimento destes vasos. 

As sequelas neurologicamente relevantes incluem: 

  • Comprometimento motor dos membros; 
  • Alterações cognitivas;
  • Dificuldades na comunicação;
  • Perda de coordenação motora; e 
  • Limitações funcionais que impeçam o exercício da atividade laborativa.

A análise jurídica considera não apenas a existência da sequela, mas sua relação com a atividade profissional específica do segurado. 

Um professor universitário que sofre AVC com sequelas motoras leves nos membros inferiores pode manter sua capacidade para lecionar. 

Por outro lado, um cirurgião com tremores residuais nas mãos, mesmo que discretos, pode estar totalmente incapacitado para sua atividade habitual.

Exemplos Práticos de Situações Concretas

A seguir, confira dois exemplos de profissionais que sofreram AVC.

Se você identificar que algum dos exemplos abaixo é similar ao seu caso, entre imediatamente em contato com um advogado previdenciário.

Botão WhatsApp – Barbieri Advogados

Caso 1: Motorista de Caminhão com Sequelas Motoras

Um motorista de caminhão de 52 anos sofre AVC isquêmico e desenvolve hemiparesia à direita (fraqueza no lado direito do corpo), com recuperação parcial após seis meses de fisioterapia. 

Embora consiga caminhar com auxílio de bengala e realizar atividades cotidianas básicas, apresenta tempo de reação diminuído e limitação na força do membro superior direito.

Neste caso, mesmo que a sequela seja considerada “moderada” do ponto de vista médico, a incapacidade para a profissão habitual é total

A atividade de motorista profissional exige reflexos rápidos, força nos membros e capacidade de reação imediata em situações de risco. 

A impossibilidade de reabilitação para a mesma função e as limitações para exercer outras atividades compatíveis com sua escolaridade e idade configuram situação propícia para aposentadoria por incapacidade permanente.

Caso 2: Analista Financeiro com Sequelas Cognitivas

Uma analista financeira de 45 anos sofre AVC hemorrágico e apresenta sequelas cognitivas: dificuldade de concentração prolongada, perda parcial de memória recente e lentificação no raciocínio lógico-matemático. 

Fisicamente, recuperou-se completamente.

Este caso ilustra situação complexa. A sequela não é visível externamente e muitas vezes é subestimada em perícias médicas rápidas. 

No entanto, a atividade de análise financeira exige precisamente as funções cognitivas comprometidas: concentração, memória e raciocínio matemático. 

A documentação neuropsicológica detalhada torna-se essencial para demonstrar a incapacidade específica para a profissão, podendo justificar benefício por incapacidade temporária (auxílio-doença) durante o período de recuperação ou, caso as sequelas se mostrem permanentes, aposentadoria por incapacidade.

Quem teve AVC tem direito a algum benefício?

três benefícios que quem sofreu avc pode ter direito

Quem teve AVC pode ter direito a três benefícios:

  1. Benefício por incapacidade temporária (auxílio-doença);
  2. Aposentadoria por incapacidade permanente (aposentadoria por invalidez);
  3. Benefício de Prestação Continuada (BPC/LOAS).

Entenda melhor sobre cada um desses três benefícios nos próximos tópicos.

1) Benefício por Incapacidade Temporária (Auxílio-Doença)

O auxílio-doença destina-se aos casos em que o segurado fica temporariamente impossibilitado de trabalhar por período superior a 15 dias consecutivos. 

Os requisitos para dar entrar no auxílio-doença incluem:

  • Carência mínima de 12 contribuições mensais;
  • Qualidade de segurado; 
  • Comprovação da incapacidade temporária mediante documentação médica e perícia.

A Reforma da Previdência de 2019 alterou a nomenclatura de auxílio-doença para benefício por incapacidade temporária, mantendo a essência do benefício. 

O período inicial de concessão costuma ser de 120 dias, podendo ser prorrogado conforme evolução clínica.

2) Aposentadoria por Incapacidade Permanente (Aposentadoria por Invalidez)

A aposentadoria por invalidez é aplicável quando a incapacidade é total e definitiva, sem possibilidade de recuperação ou reabilitação profissional. 

Exige os mesmos requisitos de carência e qualidade de segurado do benefício temporário, acrescidos da comprovação de que a incapacidade é permanente.

Importante: a legislação prevê situações em que a carência de 12 meses é dispensada, particularmente nos casos de doenças graves especificadas em lei. 

Embora o AVC em si não esteja nessa lista, as sequelas graves podem, em certas circunstâncias, ser equiparadas.

Para saber se a sua situação é isenta de carência, converse com um advogado especialista.

Botão WhatsApp – Barbieri Advogados

Além do mais, tenha em mente que, para o segurado que recebe aposentadoria por invalidez e necessita dos cuidados diários de outra pessoa, é possível solicitar um adicional de 25% no valor desse benefício.

3) Benefício de Prestação Continuada (BPC/LOAS)

Para indivíduos que nunca contribuíram para a Previdência Social ou perderam a qualidade de segurado, existe o BPC, benefício assistencial no valor de um salário mínimo mensal. 

O BPC pode ser concedido a Pessoas com Deficiência (PcDs) ou idosos com 65 anos ou mais em situação de miserabilidade social, caracterizada por renda per capita [por indivíduo] familiar inferior a um quarto do salário mínimo.

A concessão do BPC exige inscrição no Cadastro Único de Programas Sociais (CadÚnico) e avaliação social pelo Centro de Referência da Assistência Social. 

A jurisprudência tem flexibilizado o critério rígido de renda quando demonstrada vulnerabilidade social por outros meios probatórios.

Documentação Necessária para quem sofreu AVC

A comprovação da incapacidade laborativa constitui o elemento central do processo previdenciário. O ônus probatório recai sobre o requerente (segurado), que deve apresentar documentação médica consistente e detalhada.

A documentação essencial inclui relatórios médicos circunstanciados que descrevam não apenas o diagnóstico, mas as limitações funcionais decorrentes.

Exames de imagem como tomografia computadorizada e ressonância magnética, laudos neurológicos evolutivos, registros de internação hospitalar e documentação fisioterápica compõem o conjunto probatório necessário.

A perícia médica administrativa no INSS avaliará a capacidade funcional residual do segurado. 

O médico perito considerará não apenas aspectos clínicos, mas também a profissão habitual, escolaridade, idade e possibilidades de reabilitação. 

Esta avaliação multidimensional frequentemente determina o resultado do requerimento.

Nas situações de indeferimento administrativo (negativa do INSS) com fundamento técnico questionável, a via judicial pode ser mais favorável

Saiba: a produção de prova pericial judicial, realizada por profissional de confiança do juízo, frequentemente permite análise mais aprofundada do caso concreto.

O Que Fazer Imediatamente Após o AVC?

Se você não saber o que fazer imediatamente após o AVC, faça a leitura dos tópicos que se seguem. Eles são cruciais para você entender como agir. 

Primeiras 48 Horas

O foco inicial deve ser exclusivamente no tratamento médico e estabilização do quadro clínico. 

Não há urgência previdenciária neste momento que justifique desviar atenção do tratamento emergencial.

Primeira Semana

Após estabilização, solicite ao médico assistente relatório detalhado descrevendo o evento, as sequelas observadas e o prognóstico inicial. 

Este documento será fundamental posteriormente

Atenção: se o segurado estiver empregado, a empresa deve ser comunicada formalmente sobre o afastamento.

Após 15 Dias de Afastamento

Se as sequelas impedem o retorno ao trabalho, chegou o momento de protocolar requerimento de benefício por incapacidade temporária

O pedido pode ser realizado através do portal Meu INSS ou aplicativo móvel. 

Importante reunir toda documentação médica disponível: 

  • Relatórios;
  • Exames;
  • Receitas médicas; 
  • Comprovantes de tratamento.

Durante o Tratamento

Mantenha registro detalhado de toda evolução clínica

Cada consulta médica, sessão de fisioterapia, novo exame ou alteração no tratamento deve ser documentada. 

Esta linha temporal será essencial para demonstrar a evolução do quadro e fundamentar eventual necessidade de prorrogação do benefício ou conversão em aposentadoria.

Aspectos Trabalhistas Relevantes

Segurados empregados têm estabilidade provisória de 12 meses após cessação do auxílio-doença que tenha durado mais de seis meses. 

Esta garantia legal protege o trabalhador durante período crítico de readaptação. 

Além disso, nos primeiros 15 dias de afastamento, o empregador é responsável pelo pagamento da remuneração.

Questões Processuais Importantes

A Data de Entrada do Requerimento administrativo (DER) marca o início do período de amparo previdenciário e influencia no eventual pagamento retroativo em caso de concessão judicial posterior. 

Por isso, mesmo que a documentação ainda não esteja completa, pode ser estratégico protocolar o requerimento e complementar a documentação posteriormente.

Como funciona a reabilitação profissional no INSS?

O INSS mantém programa de reabilitação profissional para segurados com capacidade laborativa residual que permita exercício de atividade diversa da habitual. 

A participação neste programa pode viabilizar retorno ao mercado de trabalho e influencia diretamente a avaliação médico-pericial.

A recusa injustificada em participar do programa de reabilitação pode fundamentar cessação de benefício por incapacidade

Por outro lado, quando a tentativa de reabilitação demonstra impossibilidade de adaptação a nova função, este fato fortalece juridicamente o argumento de incapacidade permanente.

Como Recorrer na Justiça Depois de Ter o Benefício do INSS Indeferido? 

O indeferimento administrativo (negativa do INSS) não encerra as possibilidades do segurado. 

A análise pericial administrativa, embora tecnicamente embasada, ocorre em condições nem sempre ideais: 

  • Tempo limitado de consulta; 
  • Impossibilidade de avaliação funcional completa; 
  • Eventual falta de especialização do perito na patologia específica.

A via judicial permite produção de prova pericial mais aprofundada, com tempo adequado para avaliação e possibilidade de quesitos específicos elaborados por assistente técnico. 

O prazo prescricional para ajuizamento é de cinco anos, contados da ciência da decisão administrativa.

Qual o Entendimento dos Tribunais? 

Os tribunais superiores têm consolidado entendimento de que a análise da incapacidade deve considerar aspectos médicos, sociais, profissionais e pessoais do segurado. 

Esta visão multidimensional representa evolução significativa na proteção previdenciária.

A jurisprudência (conjunto de decisões) reconhece que determinadas profissões exigem capacidades específicas cuja perda, mesmo parcial, pode configurar incapacidade total para aquela atividade. 

O cirurgião com tremor residual, o piloto com déficit visual discreto ou o professor com dificuldades graves de comunicação ilustram situações em que a incapacidade profissional específica justifica concessão de benefício.

Conclusão

O AVC e suas sequelas representam desafio complexo no direito previdenciário. 

A análise adequada exige compreensão dos aspectos médicos e dos requisitos legais aplicáveis a cada modalidade de benefício, sempre considerando as particularidades do caso concreto.

A documentação médica consistente, a escolha adequada da modalidade de benefício e o acompanhamento técnico especializado são determinantes para o êxito das pretensões previdenciárias. 

O momento de buscar orientação profissional qualificada não é após o indeferimento, mas idealmente desde o início do processo, para garantir instrução adequada do requerimento administrativo.

As sequelas do AVC afetam não apenas a saúde, mas toda a estrutura de vida do segurado e de sua família. 

O sistema previdenciário existe precisamente para oferecer proteção nestas situações de vulnerabilidade, e o conhecimento dos direitos disponíveis constitui o primeiro passo para assegurar esta proteção.

Fale com um advogado previdenciário! Com o acompanhamento de um especialista, você tem mais chances de conquistar seu benefício.

Botão WhatsApp – Barbieri Advogados

Achou este artigo importante? Se você tem algum amigo ou familiar que sofreu AVC, compartilhe este material.

Abraço! E até mais.

Maurício Lindenmeyer Barbieri é sócio da Barbieri Advogados, Mestre em Direito pela UFRGS e inscrito na Ordem dos Advogados da Alemanha (RAK Stuttgart nº 50.159), Portugal (Lisboa nº 64443L) e Brasil (OAB/RS 36.798, OAB/DF 24.037, OAB/SC 61.179-A, OAB/PR 101.305, OAB/SP 521.298). Membro da Associação de Juristas Brasil-Alemanha.