STJ consolida entendimento sobre fiança bancária e seguro garantia em créditos não tributários

10 de julho de 2025

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Decisão histórica estabelece marco definitivo para suspensão da exigibilidade de multas administrativas e outros débitos não tributários

Em decisão unânime que marca um importante avanço para a prática jurídica brasileira, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) firmou, em junho de 2025, o entendimento definitivo sobre a possibilidade de suspensão da exigibilidade de créditos não tributários mediante oferecimento de fiança bancária ou seguro garantia.

O julgamento do Recurso Especial nº 2.037.787/RJ, de relatoria do Ministro Afrânio Vilela, consolidou uma evolução jurisprudencial que vinha sendo construída há anos e que agora ganha contornos definitivos através da fixação de tese em regime de recursos repetitivos.

A tese firmada pelo STJ

Tema Repetitivo nº 1.203:

“O oferecimento de fiança bancária ou de seguro garantia, desde que corresponda ao valor atualizado do débito, acrescido de 30% (trinta por cento), tem o efeito de suspender a exigibilidade do crédito não tributário, não podendo o credor rejeitá-lo, salvo se demonstrar insuficiência, defeito formal ou inidoneidade da garantia oferecida.”

Contexto e evolução jurisprudencial

Historicamente, os tribunais aplicavam por analogia ao crédito não tributário as mesmas regras previstas para os tributos, exigindo depósito integral em dinheiro para suspensão da exigibilidade, com base no art. 151 do Código Tributário Nacional e na Súmula 112/STJ.

Essa interpretação criava significativas dificuldades práticas para empresas que enfrentavam multas administrativas, especialmente em setores altamente regulados como saúde suplementar, telecomunicações e serviços financeiros, onde as penalidades podem alcançar valores expressivos.

Os fundamentos da decisão

O acórdão assentou suas bases em sólidos argumentos jurídicos:

1. Equiparação legal das garantias

O STJ reconheceu que tanto a Lei de Execuções Fiscais (Lei nº 6.830/1980) quanto o Código de Processo Civil de 2015 equiparam expressamente a fiança bancária e o seguro garantia ao depósito em dinheiro para fins de garantia da execução.

2. Princípio da menor onerosidade

A Corte destacou que essas modalidades de garantia atendem ao princípio da menor onerosidade previsto no art. 805 do CPC/2015, permitindo que as empresas mantenham seu capital de giro sem comprometer suas atividades operacionais.

3. Segurança jurídica e liquidez

O Tribunal enfatizou que tanto a fiança bancária quanto o seguro garantia oferecem a mesma segurança e liquidez do dinheiro, sendo automaticamente conversíveis em recursos para satisfação do crédito quando necessário.

Impactos práticos da decisão

Para as empresas

A decisão representa um alívio significativo para o meio empresarial, permitindo:

  • Preservação do capital de giro: As empresas não precisarão mais imobilizar recursos financeiros para suspender multas administrativas
  • Continuidade operacional: Manutenção das atividades sem comprometimento da liquidez
  • Planejamento financeiro: Maior previsibilidade e flexibilidade na gestão de contingências

Para o mercado segurador

O julgamento traz importantes benefícios para o setor:

  • Segurança jurídica: Consolidação definitiva da validade do seguro garantia para esta finalidade
  • Expansão do mercado: Ampliação das oportunidades de negócio no segmento
  • Padronização de critérios: Estabelecimento de parâmetros claros para aceitação das garantias

Para a prática forense

A tese estabelece diretrizes importantes:

  • Vinculação dos tribunais: Aplicação obrigatória em casos similares
  • Redução de litígios: Menor margem para interpretações divergentes
  • Celeridade processual: Agilização na análise de pedidos de suspensão

Pontos de atenção na aplicação prática

Requisitos para aceitação

A garantia deve atender aos seguintes critérios:

  1. Valor adequado: Corresponder ao débito atualizado acrescido de 30%
  2. Idoneidade formal: Estar em conformidade com as normas regulamentares
  3. Suficiência: Cobrir integralmente o valor devido

Papel do magistrado

O STJ esclareceu, através do voto vogal do Ministro Paulo Sérgio Domingues, posteriormente incorporado pelo relator, que:

  • A Fazenda Pública deve ser ouvida, mas sua manifestação tem caráter opinativo
  • O juiz é o destinatário final da análise da garantia
  • A decisão sobre idoneidade compete ao magistrado, não à administração

Questão dos prazos de vigência

O Tribunal superou entendimento anterior que exigia garantias com prazo indeterminado, estabelecendo que:

  • A simples fixação de prazo não implica inidoneidade
  • A renovação automática deve ser assegurada enquanto persistir o risco
  • Cláusulas adequadas podem suprir eventual limitação temporal

Reflexos em outros segmentos jurídicos

A decisão pode influenciar discussões em outras áreas:

  • Execuções cíveis: Aplicação analógica em cumprimento de sentença
  • Direito administrativo: Contestação de outros tipos de sanções
  • Direito regulatório: Discussões com agências reguladoras

Perspectivas futuras

A consolidação desta tese representa um marco na evolução do direito processual brasileiro, sinalizando uma tendência de:

  1. Modernização do sistema executivo: Adaptação às realidades econômicas contemporâneas
  2. Equilíbrio de interesses: Proteção tanto do credor quanto do devedor
  3. Eficiência processual: Redução de custos e tempo nos processos

Conclusão

A decisão da Primeira Seção do STJ no Tema 1.203 representa muito mais que uma simples evolução jurisprudencial. Trata-se de um marco que reconhece a realidade econômica moderna e a necessidade de instrumentos eficientes para garantia de execuções.

Para as empresas, especialmente aquelas sujeitas a intenso controle regulatório, a possibilidade de utilizar fiança bancária ou seguro garantia para suspender a exigibilidade de multas administrativas representa um importante alívio financeiro e operacional.

O mercado segurador, por sua vez, ganha importante impulso com a consolidação definitiva da segurança jurídica para estes produtos, podendo expandir sua atuação com maior confiança.

Por fim, a prática forense se beneficia com a uniformização de critérios e a redução de incertezas, contribuindo para um sistema de justiça mais eficiente e previsível.


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