Rescisão Indireta por Falta de FGTS: O Fim do Requisito da Imediatidade
Rescisão Indireta por Falta de FGTS: O Fim do Requisito da Imediatidade
O Tribunal Superior do Trabalho consolidou em 2025 entendimento já majoritário sobre a rescisão indireta do contrato de trabalho. Através de tese vinculante, confirmou-se que o requisito da imediatidade não se aplica aos casos de ausência ou irregularidade no recolhimento do FGTS. A decisão, proferida no processo RRAg-1000063-90.2024.5.02.0032, pacifica definitivamente o entendimento sobre o descumprimento dessa obrigação contratual pelo empregador.
A Tese Fixada
“A ausência ou irregularidade no recolhimento dos depósitos de FGTS caracteriza descumprimento de obrigação contratual, nos termos do art. 483, ‘d’, da CLT, suficiente para configurar a rescisão indireta do contrato de trabalho, sendo desnecessário o requisito da imediatidade.”
O Contexto da Decisão
A jurisprudência trabalhista historicamente divergia sobre a aplicação do princípio da imediatidade nesses casos. Parte dos julgados exigia que o empregado agisse rapidamente ao descobrir irregularidades no FGTS, sob pena de caracterizar perdão tácito. Esse entendimento criava situação paradoxal: trabalhadores descobriam anos depois que seus depósitos não foram realizados, mas ficavam impedidos de pleitear a rescisão indireta por suposta aquiescência.
A tese agora vinculante reconhece a natureza continuada da obrigação de recolhimento do FGTS. Cada mês sem depósito renova a violação contratual, tornando inadequada a aplicação do princípio da imediatidade tradicionalmente exigido para configuração da justa causa. O TST consolida assim entendimento que já prevalecia em diversos tribunais regionais, reconhecendo a distinção entre obrigações instantâneas e obrigações de trato sucessivo.
Alcance e Aplicação
A tese abrange tanto a ausência total de recolhimentos quanto irregularidades parciais, como depósitos em valor inferior ao devido ou realizados intempestivamente. Aplica-se a todos os contratos de trabalho regidos pela CLT, independentemente da categoria profissional ou porte da empresa.
O fundamento legal reside no artigo 483, alínea “d”, da CLT, que autoriza o empregado a considerar rescindido o contrato quando o empregador descumprir obrigações contratuais. O FGTS, direito constitucional dos trabalhadores urbanos e rurais, constitui obrigação fundamental da relação de emprego. Seu inadimplemento representa violação grave o suficiente para tornar insustentável a continuidade do vínculo.
A decisão não exige demonstração de prejuízo específico. O simples descumprimento da obrigação, verificável através de extrato da conta vinculada, autoriza o pedido de rescisão indireta. Não importa se o trabalhador tinha conhecimento anterior da irregularidade ou se continuou prestando serviços após descobri-la.
Impactos Econômicos e Jurídicos
Para empresas em dificuldade financeira, a decisão intensifica o risco jurídico. Não é incomum que empresas em crise priorizem salários e deixem de recolher FGTS, apostando na manutenção do vínculo. Com a tese vinculante, qualquer empregado pode, a qualquer tempo, converter essa inadimplência em rescisão indireta, recebendo todas as verbas de dispensa imotivada.
Na rescisão indireta, o trabalhador tem direito a aviso prévio, multa de quarenta por cento sobre o FGTS, férias proporcionais, décimo terceiro proporcional e liberação do seguro-desemprego. Para uma empresa com cem funcionários e salário médio de três mil reais, a conversão coletiva em rescisão indireta pode representar desembolso imediato superior a quinhentos mil reais.
O impacto processual é igualmente relevante. Elimina-se discussão probatória sobre o momento da ciência da irregularidade ou sobre a reação do empregado. O debate limita-se à existência ou não dos depósitos, matéria de simples comprovação documental através de extratos do FGTS.
Questões Práticas Relevantes
A tese não impede acordos para regularização. Empresas podem negociar parcelamento do passivo de FGTS diretamente com empregados ou através de acordos coletivos. Contudo, o descumprimento do acordo autoriza imediatamente o pedido de rescisão indireta, sem necessidade de notificação prévia.
Para empresas em recuperação judicial, a situação é particularmente delicada. Embora créditos trabalhistas sejam preferenciais, a rescisão indireta em massa pode inviabilizar a continuidade operacional, contrariando o princípio da preservação da empresa. Ainda não há posicionamento consolidado sobre eventual limitação da tese nestes casos.
Trabalhadores devem documentar adequadamente a irregularidade antes de comunicar a rescisão indireta. Recomenda-se obtenção de extrato analítico do FGTS e, preferencialmente, notificação extrajudicial ao empregador antes do ajuizamento da ação. Embora não obrigatórias, essas medidas fortalecem a posição processual.
A uniformização desse entendimento através de precedente vinculante encerra décadas de insegurança jurídica sobre o tema, estabelecendo regra clara tanto para empregadores quanto para trabalhadores sobre as consequências do inadimplemento dessa obrigação fundamental.

Equipe de Redação da Barbieri Advogados é responsável pela produção e revisão de conteúdos técnicos, assegurando comunicação clara, precisa e alinhada aos valores institucionais. A Barbieri é inscrita na OAB/RS sob o nº 516.
