Prescrição Intercorrente: Conceito e Relevância.

01 de outubro de 2025

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Introdução à Prescrição Intercorrente no Direito Tributário | Barbieri Advogados

PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE: COMO PROTEGER SUA EMPRESA DE DÍVIDAS TRIBUTÁRIAS INDEFINIDAS.

Entenda a prescrição intercorrente, um mecanismo legal crucial que impede a cobrança eterna de dívidas tributárias. Saiba como defender sua empresa contra a inércia da Fazenda Pública e garantir a segurança jurídica de suas operações.


Prescrição Intercorrente: Protegendo Sua Empresa e a Inércia da Fazenda Pública.

No desafiador cenário tributário brasileiro, empresas e contribuintes frequentemente enfrentam o risco de cobranças fiscais que se arrastam por anos, gerando incertezas financeiras e comprometendo o planejamento estratégico. A prolongada duração de processos administrativos e judiciais é uma preocupação constante. No entanto, o sistema jurídico oferece um mecanismo essencial para limitar sua extensão: a prescrição intercorrente.

Este instituto legal impede que a morosidade do Estado — seja na administração pública ou no judiciário — resulte em um ônus perpétuo para o contribuinte. Ele estabelece limites temporais claros para a atuação do Fisco, garantindo que o direito de cobrar um crédito tributário seja exercido dentro de prazos razoáveis. Compreender a prescrição intercorrente é vital para a gestão de riscos e a proteção do patrimônio empresarial. Este artigo desmistifica seus fundamentos, a evolução de sua aplicação no Brasil e as estratégias defensivas que sua empresa pode e deve adotar.


1. Prescrição Intercorrente: Conceito e Relevância.

A prescrição intercorrente é uma modalidade de prescrição que se manifesta durante um processo, judicial ou administrativo. Ela extingue o direito de cobrança quando a Fazenda Pública, o credor, permanece inerte e injustificadamente passivo por um período superior ao legalmente estabelecido. Ao contrário da prescrição ordinária, que começa a contar da constituição definitiva do crédito, a intercorrente inicia sua contagem no decorrer do processo, ligada à paralisação por desídia do exequente.

Sua importância é imensa para a segurança jurídica dos contribuintes. No Brasil, dada a notória lentidão processual, a prescrição intercorrente atua como um limite à perpetuação indefinida de litígios fiscais. Ela efetiva o princípio constitucional da razoável duração do processo (Art. 5º, LXXVIII, CF/88), assegurando que pessoas e empresas não sejam indefinidamente submetidas a cobranças.

O fundamento legal para a prescrição intercorrente no direito tributário baseia-se no Art. 174 do Código Tributário Nacional (CTN). A interpretação sistemática desse artigo, em conjunto com princípios como a segurança jurídica e a eficiência administrativa (Art. 37 da CF/88), solidificou sua aplicação. Mais do que um benefício ao devedor, a prescrição intercorrente incentiva a Fazenda Pública a otimizar seus procedimentos de cobrança, promovendo maior eficiência e modernização.

É crucial diferenciar a prescrição intercorrente da decadência. A decadência refere-se ao prazo que a Fazenda tem para constituir o crédito tributário (lançar o tributo). Ela opera automaticamente e impede a própria existência do crédito. A prescrição, e por extensão a intercorrente, diz respeito ao prazo para a cobrança de um crédito já constituído. Enquanto a decadência extingue o direito de constituir, a prescrição extingue a exigibilidade da dívida e deve ser alegada pela parte interessada. A prescrição intercorrente é, portanto, uma especificidade da prescrição, focada na inatividade durante o processo de cobrança.


2. O Tema 1.293 do STJ: Um Marco Decisivo.

A aplicação da prescrição intercorrente no Brasil foi uniformizada pelo Tema 1.293 do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Este precedente vinculante marcou um ponto de virada, estendendo a aplicabilidade do instituto para além do âmbito judicial, alcançando também os processos administrativos fiscais.

Historicamente, havia divergências sobre a aplicação da prescrição intercorrente em processos administrativos, especialmente em penalidades aduaneiras. A Receita Federal, por exemplo, resistia. Contudo, o acúmulo de processos administrativos paralisados por anos, gerando custos elevados e profunda insegurança para os contribuintes, exigiu uma solução uniforme.

A decisão do STJ no Tema 1.293 foi categórica: “é aplicável a prescrição intercorrente aos processos administrativos fiscais”. A tese fixada, essencial para a advocacia tributária, estabeleceu que: “a prescrição intercorrente, prevista no art. 40 da Lei 6.830/1980, é aplicável aos processos administrativos fiscais quando caracterizada a inércia da Fazenda Pública por mais de 1 (um) ano, ressalvadas as hipóteses de suspensão e interrupção da prescrição.”

As penalidades aduaneiras foram o caso paradigma, ilustrando a complexidade e morosidade típicas. Essa decisão demonstrou que a prescrição intercorrente não enfraquece a arrecadação, mas sim incentiva o Estado a ser mais eficiente.

Os impactos foram imediatos na prática administrativa. Órgãos como a Receita Federal foram obrigados a implementar mudanças procedimentais significativas: desenvolvimento de sistemas de controle de prazos automatizados, reorganização de fluxos e estabelecimento de protocolos de urgência. O treinamento de servidores e a melhoria da comunicação com contribuintes também foram resultados diretos, modernizando a gestão fiscal e prevenindo a prescrição intercorrente.


3. Prescrição Intercorrente em Execuções Fiscais: A Aplicação Prática.

Nas execuções fiscais, a prescrição intercorrente é mais frequente e tecnicamente complexa, dada a dinâmica da Lei nº 6.830/80. Sua aplicação é crucial para equilibrar as prerrogativas do ente público e os direitos dos contribuintes.

O cerne da prescrição intercorrente em execuções fiscais está no Art. 40 da Lei 6.830/80. Ele prevê que o juiz suspenderá o processo se o devedor ou bens penhoráveis não forem encontrados. Durante essa suspensão, o prazo prescricional não correria. Contudo, a jurisprudência do STJ clarifies que a suspensão não pode ser ilimitada. Após um período de suspensão (geralmente um ano), se a Fazenda Pública não promover diligências efetivas, o prazo da prescrição intercorrente recomeça a correr.

O prazo prescricional geral para cobrança de créditos tributários é de cinco anos (CTN). Na prescrição intercorrente, esse prazo é reativado após o período de suspensão (um ano) sem atos úteis da Fazenda. O marco inicial dessa contagem é a paralisação por inércia do Fisco, não apenas a suspensão formal.

Para fugir da inércia, não bastam atos cartorários ou petições genéricas. A jurisprudência exige medidas concretas da Fazenda, como consultas a BACENJUD, RENAJUD e INFOJUD, ou pesquisas em registros. O ônus da prova é compartilhado: o contribuinte demonstra a inércia com documentação detalhada; a Fazenda comprova a efetividade das diligências.

As causas interruptivas seguem o Art. 174, parágrafo único do CTN, como citação pessoal ou penhora efetiva de bens. Causas suspensivas, como moratória ou parcelamento, impedem a contagem do prazo enquanto durarem.


4. Morosidade Judicial vs. Inércia da Fazenda Pública: Distinção Crucial.

A lentidão do Judiciário brasileiro é um problema crônico. Contudo, para a prescrição intercorrente, é fundamental diferenciar a morosidade sistêmica da inércia da Fazenda Pública.

A inércia judicial ocorre quando a paralisação do processo é atribuível ao próprio Judiciário – por exemplo, demora na análise de petições. Nesses casos, a lentidão não é culpa da Fazenda Pública e, portanto, não configura prescrição intercorrente. O STJ é claro: a prescrição intercorrente exige inércia qualificada da Fazenda Pública, ou seja, ausência de ações e diligências úteis por parte do exequente.

Já a inércia da Fazenda Pública manifesta-se pela falta de iniciativas proativas para dar andamento à execução. Isso inclui falha em indicar bens penhoráveis, omissão em atualizar endereços de devedores, negligência no uso de ferramentas tecnológicas (BACENJUD, RENAJUD, INFOJUD), ou abandono efetivo da execução.

Essa distinção é vital para a defesa. A Súmula 314 do STJ ilustra: “em execução fiscal, não localizados bens penhoráveis, suspende-se o processo por um ano, findo o qual se inicia o prazo da prescrição quinquenal”. Ou seja, mesmo com lentidão judicial, se a Fazenda não age efetivamente após a suspensão, a prescrição intercorrente pode ser reconhecida. A responsabilidade é objetiva, focada nas ações (ou inações) das partes. A não utilização adequada de ferramentas tecnológicas pela Fazenda pode ser interpretada como inércia qualificada.


5. Estratégias Defensivas em Embargos à Execução Fiscal.

A prescrição intercorrente é uma das teses defensivas mais eficazes em embargos à execução fiscal. O Art. 16, § 1º, da Lei 6.830/80 permite a alegação de qualquer matéria de defesa, e a prescrição intercorrente é uma matéria de ordem pública que o juiz pode reconhecer de ofício.

A estratégia processual exige precisão. A petição inicial dos embargos deve apresentar uma cronologia detalhada dos atos processuais, comprovando os períodos de inércia da Fazenda Pública superiores a um ano. Essa demonstração deve ser solidamente fundamentada, citando precedentes do STJ e doutrina.

A prova documental é central: certidões cartorárias, cópias de decisões judiciais, comprovantes de diligências (ou ausência delas) e pareceres técnicos que demonstrem a inadequação das medidas da Fazenda são indispensáveis. A análise crítica das diligências alegadas pela Fazenda é crucial, pois atos meramente formais podem não afastar a inércia.

O momento processual ideal varia. Embora os embargos à execução sejam o principal instrumento, a prescrição intercorrente também pode ser arguida em exceção de pré-executividade (com prova pré-constituída) ou, excepcionalmente, incidentalmente em outras manifestações.


6. Evolução, Tendências e Impactos na Gestão Fiscal e Empresarial.

Desde o Tema 1.293, a jurisprudência tem aplicado a prescrição intercorrente consistentemente, refinando seus conceitos. O STJ ampliou seu alcance a diversas modalidades de créditos tributários – federais, estaduais e municipais. Tribunais Regionais Federais têm contribuído com jurisprudência detalhada.

As tendências futuras apontam para maior rigor na aplicação da prescrição intercorrente. A digitalização completa dos processos judiciais e a inteligência artificial nos tribunais criarão expectativas ainda maiores de celeridade. Ferramentas que identificam padrões de inércia e sugerem decisões tendem a reduzir a subjetividade e promover maior uniformidade. A análise econômica do direito e a sustentabilidade também influenciam, considerando os custos sociais e ambientais de execuções prolongadas.

Os impactos econômicos são notáveis. Relatórios da PGFN indicam a extinção de bilhões em créditos tributários, muitos improdutivos. Paradoxalmente, essa medida tem levado a um aumento na eficiência arrecadatória, pois a necessidade de evitar a prescrição incentiva a Fazenda a otimizar suas ações. Para os contribuintes, o benefício é imenso: redução da insegurança jurídica, liberação de recursos e possibilidade de recuperação financeira, especialmente para PMEs.

Essa transformação impulsionou uma revolução tecnológica na administração tributária. O desenvolvimento de sistemas sofisticados de controle de prazos (como o SIAP da PGFN), Business Intelligence e APIs que automatizam consultas e diligências, demonstra um investimento massivo. Esses avanços geram ganhos significativos de eficiência operacional e melhoram a qualidade dos serviços aos contribuintes, com respostas mais rápidas e maior transparência.


7. Estratégias Avançadas e Recomendações.

Para empresas e contribuintes, a prescrição intercorrente deve ser parte integrante de um planejamento defensivo e preventivo. Isso inclui:

  • Monitoramento Ativo: Implementar sistemas internos para controle de prazos e acompanhamento sistemático de todos os processos tributários, administrativos e judiciais. Análise preditiva pode identificar precocemente riscos e oportunidades.

  • Documentação Sistemática: Manter registros detalhados de todas as comunicações com órgãos tributários, protocolos, respostas e prazos. Uma base probatória sólida é crucial.

  • Assessoria Jurídica Especializada: A complexidade da matéria exige parceria com expertise aprofundada na jurisprudência em evolução, domínio das ferramentas tecnológicas de análise e capacidade crítica. A escolha do veículo processual e a petição robusta são chaves para o sucesso.

Para a Administração Pública, a continuidade dos investimentos em modernização tecnológica, capacitação de servidores e aprimoramento de procedimentos internos é fundamental para evitar prescrições desnecessárias. O foco deve ser na qualidade das execuções, priorizando casos com maior potencial de recuperação.

A consolidação da prescrição intercorrente no direito tributário brasileiro representa um avanço significativo no equilíbrio entre as prerrogativas do Estado e os direitos fundamentais do contribuinte. É um instituto que impulsiona a eficiência administrativa, a celeridade processual e, sobretudo, a segurança jurídica. Um assessoramento especializado estará sempre preparado para auxiliar você ou sua empresa a navegar por este cenário complexo, garantindo a proteção de seus direitos e assegurando que a inércia do Estado não se transforme em um encargo indefinido para seus interesses.