Prescrição Antecipada em Crimes Tributários: O Que o Empresário Precisa Saber Sobre o Prazo do Fisco

prescrição em crimes tributários

22 de outubro de 2025

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Por Dr. Caio Cesar da Silva Oliveira

Mestre em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Advogado inscrito na OAB sob o nº 132.362. Advogado da Barbieri Advogados.

Entenda a nova prescrição antecipada em crimes tributários, minimize riscos e defenda-se eficazmente. Informações cruciais para sua segurança jurídica.

Tempo de leitura: 8 minutos


Este artigo integra série sobre Crimes Tributários e Estratégias de Defesa Empresarial. Leia também:


I. Introdução

A gestão empresarial exige conformidade legal rigorosa. A esfera tributária apresenta riscos onde irregularidades podem descambar para o âmbito penal. A prescrição, em especial a prescrição em crimes tributários, que estabelece um limite temporal para o Estado punir, é crucial para a segurança jurídica. No entanto, recentes decisões jurisprudenciais alteraram a dinâmica da justiça criminal tributária, exigindo nova compreensão.

II. A Prescrição Penal: Conceito e Fundamentos

A prescrição penal limita o poder punitivo estatal, garantindo que, após certo tempo sem ação, o direito de aplicar a sanção se extinga. É uma garantia contra a persecução perpétua, fundamental para a estabilidade das relações jurídicas. Conhecer a contagem, interrupção e suspensão dos prazos prescricionais é essencial na gestão de riscos.

III. O Marco Tradicional: Súmula Vinculante nº 24 e a Proteção do Empresário

Tradicionalmente, a persecução penal em crimes tributários dependia da conclusão de processos administrativos fiscais para a constituição definitiva do crédito. A Súmula Vinculante nº 24 do STF determinava que “não se tipifica crime contra a ordem tributária […] antes do lançamento definitivo do tributo”. Isso aplicava-se a crimes materiais, que exigem a efetiva supressão ou redução do tributo. A Súmula funcionava como condição de punibilidade e marco inicial para a contagem prescricional, conferindo segurança ao empresário e permitindo a discussão administrativa prévia à ação penal.

IV. A Virada Jurisprudencial do STJ: Crime Formal e o Novo Marco Inicial da contagem da prescrição em crimes tributários

O Superior Tribunal de Justiça (STJ), porém, introduziu um novo entendimento que impacta essa previsibilidade. A mudança redefine o momento de configuração de um delito específico: a falha na emissão de nota fiscal.

O ponto central da virada jurisprudencial reside na interpretação do artigo 1º, inciso V, da Lei nº 8.137/1990. Este dispositivo criminaliza a conduta de “negar ou deixar de fornecer […] nota fiscal ou documento equivalente […] ou fornecê-la em desacordo com a legislação”. O foco não é a supressão do tributo, mas a violação da formalidade documental, essencial ao controle fiscal.

A Sexta Turma do STJ, ao julgar o Recurso em Habeas Corpus n. 209.207/GO, reafirmou o caráter formal do crime do artigo 1º, inciso V. Diferente dos crimes materiais, o crime formal consuma-se com a mera prática da conduta, independentemente de resultado naturalístico (como prejuízo fiscal ou débito apurado). Assim, a consumação ocorre no momento da falha documental.

Consequentemente, a Súmula Vinculante nº 24 não se aplica a este delito. Uma vez que a consumação independe da apuração do tributo ou esgotamento da via administrativa, a exigência do lançamento definitivo perde o sentido. O prazo prescricional para o crime do artigo 1º, inciso V, é contado a partir da prática da falha. Isso antecipa o início da prescrição, acelerando a persecução penal e reduzindo o tempo de defesa do empresário.

V. Impactos Práticos para o Empresário

As implicações práticas da “prescrição antecipada” são urgentes para as empresas. A celeridade da persecução penal significa um intervalo reduzido entre a irregularidade documental e a instauração de um processo criminal. Isso diminui o tempo para defesa prévia, regularização ou construção de estratégia jurídica. Um problema fiscal pode se tornar criminal muito mais rapidamente.

Na prática, o Ministério Público terá maior margem temporal para promover a ação penal, já que a prescrição se iniciou antecipadamente. Contudo, essa mudança pode apresentar efeitos ambivalentes para o empresário, dependendo das circunstâncias concretas do caso.

Há também o risco de acusações antigas. Como a prescrição em crimes tributários começa na data da falha documental, irregularidades passadas, mesmo não fiscalizadas, podem fundamentar uma ação penal. Isso exige que as empresas revisem retrospectivamente a conformidade de suas operações fiscais.

A nova dinâmica impõe monitoramento constante e retroativo das obrigações acessórias, especialmente a emissão e conformidade das notas fiscais. É crucial revisar registros passados para identificar e corrigir falhas que já podem ter deflagrado o prazo prescricional. Robustos controles internos e auditoria da documentação fiscal tornam-se indispensáveis.

VI. Estratégias de Proteção e Gestão de Riscos

Diante desse cenário, empresas precisam reorientar suas estratégias de gestão de risco e defesa:

1. Mapeamento de Vulnerabilidades

Revisão sistemática dos processos de emissão, guarda e conformidade de notas fiscais para identificar falhas atuais e passadas. Determinar a data exata de cada potencial falha para calcular o período prescricional e avaliar riscos.

2. Atuação Preventiva (Compliance Documental e Fiscal)

Implementar um programa robusto e efetivo de compliance. Garantir sistemas de emissão de notas fiscais parametrizados, colaboradores treinados e controles internos para corrigir falhas antes que se consumem como crime.

3. Gerenciamento Proativo de Passivos

Pagamento Integral: O pagamento integral do tributo e seus acessórios extingue a punibilidade dos crimes contra a ordem tributária (Art. 9º, § 2º, Lei nº 10.684/2003).

Parcelamento: A adesão a um regime de parcelamento suspende a pretensão punitiva do Estado (Art. 9º, caput, Lei nº 10.684/2003). O cumprimento integral pode extinguir a punibilidade.

Uma assessoria jurídica especializada é crucial para monitorar gatilhos jurídicos e planejar a proteção empresarial.

Conclusão: Gestão Temporal como Estratégia de Defesa

A mudança jurisprudencial do STJ quanto ao marco inicial da prescrição nos crimes de falha documental fiscal redefine substancialmente a gestão de riscos tributários. A antecipação do termo inicial da contagem prescricional tributária para o momento da prática da conduta, independentemente da apuração administrativa do débito, impõe às empresas nova dinâmica de vigilância e proteção.

A gestão temporal dos riscos criminais passa a ser elemento central da estratégia de defesa empresarial. Compreender os prazos prescricionais, em especiais os envolvendo a prescrição de crimes tributários, identificar causas interruptivas e suspensivas, e mapear retroativamente irregularidades documentais são medidas essenciais para avaliar a exposição efetiva ao risco penal.

Nesse contexto, a assessoria jurídica especializada torna-se indispensável para a realização de auditoria prescricional, identificação de vulnerabilidades temporais e construção de estratégias integradas que combinem compliance, regularização fiscal e defesa penal. Empresas que investem em gestão proativa do passivo tributário, monitoramento de prazos prescricionais e conformidade documental rigorosa não apenas mitigam riscos criminais, mas também transformam a complexidade normativa em vantagem competitiva, operando com segurança jurídica em ambiente de crescente fiscalização.