Lei 14.905/2024: Reforma do Artigo 406 e Transição Normativa — Impactos Prospectivos

01 de novembro de 2025

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Introdução à Lei 14.905/2024: Reforma do Artigo 406 do Código Civil

Lei 14.905/2024: Reforma do Artigo 406 e Transição Normativa — Impactos Prospectivos

Introdução

A Lei 14.905/2024 não constituiu simples reafirmação legislativa da decisão STJ Tema 1368. Representou decisão normativa substancial de reconfiguracao do regime de juros moratórios em relações civis prospectivamente, introduzindo mecanismo de dedução de correção monetária que resolve problema técnico deixado aberto pela jurisprudência.

A presente análise examina como essa transição normativa afeta estruturação contratual futura, gestão de passivos judiciais e conformidade com normas contábeis aplicáveis, tanto em regime internacional (IFRS) quanto em regime tradicional brasileiro (BR GAAP).


O Problema que Lei 14.905/2024 Resolve

A decisão STJ Tema 1368, embora consolidasse SELIC como taxa legal, deixou questão técnica não plenamente resolvida: como operar quando SELIC já incorpora simultaneamente juros moratórios E correção monetária em indexador único?

Dupla Remuneração: Cenário Que Se Evita

Antes de Lei 14.905/2024, cenário problemático poderia ocorrer:

Imagine dívida de R$ 100.000,00 com período de mora de 24 meses em economia de inflação de 8% ao ano (IPCA). Se SELIC acumulada no período foi de 20%, isso incorpora simultaneamente:

  • Compensação pela mora (juros genuínos)

  • Reposição da inflação (correção monetária)

Se simultaneamente se aplicasse correção monetária adicional sobre a base (IPCA acumulado), credor receberia dupla remuneração pela inflação: uma vez incorporada em SELIC, outra vez em correção monetária separada.

Lei 14.905/2024 resolve precisamente isto: estabelece que SELIC aplicar-se-á com dedução de correção monetária, evitando dupla remuneração.

Racionalidade Econômica

A dedução assegura que credor seja remunerado pelo tempo decorrido (juros), compensado pela inflação (correção), sem receber remuneração duplicada pela mesma inflação.

Esta estrutura alinha-se com realidade econômica e evita enriquecimento sem causa, preservando função compensatória, não punitiva, dos juros moratórios.


Análise da Nova Redação do Artigo 406

Redação Anterior (Pré-Lei 14.905/2024)

O artigo 406 do Código Civil de 2002 estabelecia originariamente:

“Quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional.”

Texto aparentemente simples gerou controvérsia de duas décadas quanto a qual taxa exatamente seria “a taxa em vigor para a mora de impostos federais”.

Redação Reformulada (Lei 14.905/2024)

A Lei reformulou integralmente o artigo:

“Art. 406. Quando não forem convencionados, ou quando o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, os juros serão fixados de acordo com a taxa legal.

§ 1º A taxa legal corresponderá à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia (Selic), deduzido o índice de atualização monetária de que trata o parágrafo único do art. 389 deste Código.”

Avanços da nova redação:

(i) Clareza literal: Não há mais ambiguidade. SELIC é expressamente designada como taxa legal;

(ii) Operacionalização: Estabelece mecanismo de dedução para evitar dupla remuneração;

(iii) Rigidez legislativa: Remove questão do plano interpretativo, fixando-a em texto legal.

Evolução Hermenêutica

O histórico representa transição clara de regime jurídico:

  • Fase 1 (2002-2024): Controvérsia interpretativa de artigo ambíguo

  • Fase 2 (outubro 2024): Consolidação jurisprudencial via STJ Tema 1368

  • Fase 3 (julho 2024 onwards): Fixação legislativa via Lei 14.905/2024

Esta progressão reduz insegurança jurídica, cristalizando em texto legal aquilo que era questão jurisprudencial.


Regime Temporal de Transição

Lei 14.905/2024 não retroage. Criou estrutura transicional clara de dois períodos com regimes distintos.

Divisão Binária: Antes e Depois de 3 de Julho de 2024

Período 1 (anterior a 3/7/2024):

  • Aplica-se regime do STJ Tema 1368

  • SELIC composta, sem dedução de correção monetária

  • Fundamentação jurídica: artigo 406 anterior à reforma

Período 2 (a partir de 3/7/2024):

  • Aplica-se regime da Lei 14.905/2024

  • SELIC composta com dedução de correção monetária

  • Fundamentação jurídica: artigo 406 reformulado

Períodos mistos (atravessam 3/7/2024):

  • Necessária segmentação em dois cálculos

  • Aplicação de metodologia distinta a cada segmento

  • Agregação de resultados para montante final

Princípio de Irretroatividade

Conforme artigo 6º, § 2º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, lei nova não retroage. Desta forma:

(i) Dívidas com períodos de mora integralmente anteriores a 3/7/2024 continuam regidas por STJ Tema 1368;

(ii) Lei 14.905 aplica-se apenas prospectivamente;

(iii) Sentenças transitadas em julgado não sofrem alteração automática pela nova lei.

Aplicação a Contratos Anteriores

Contrato celebrado antes de 3/7/2024, mas com período de mora estendendo-se após essa data, submete-se a regime misto:

  • Período anterior: STJ Tema 1368

  • Período posterior: Lei 14.905/2024

A lei também preserva autonomia contratual: se partes expressamente convencionaram taxa diversa, prevaleça a vontade contratual. Lei 14.905 constitui norma supletiva, aplicável quando não há disposição contratual específica.


Mecanismo de Dedução de Correção Monetária

Conceito Jurídico

A “dedução de correção monetária” não significa simples subtração aritmética. Significa que, do fator de acumulação gerado por SELIC (que incorpora juros + correção), deduz-se o componente inflacionário, preservando apenas juros genuínos.

Formulação conceitual:

Fator de juros genuínos = Fator SELIC — Fator de inflação

Se resultado for negativo (inflação superior a SELIC), juros são fixados em zero para o período.

Operacionalização

A dedução operacionaliza-se mediante comparação entre evolução de SELIC e evolução de índice de atualização monetária (ordinariamente IPCA, conforme artigo 389 do Código Civil).

Qual índice exatamente deduzir permanece questão parcialmente aberta. O CPC 25 e IFRS 9 oferecem orientações, mas Lei 14.905 deixou detalhes a regulamentação do Conselho Monetário Nacional.

Cenário de Resultado Negativo

Período de inflação negativa (deflação) gera situação onde SELIC < inflação acumulada. Neste caso, juros moratórios seriam tecnicamente negativos, o que a lei resolve fixando-os em zero.

Cenário raro no Brasil contemporâneo, mas teoricamente possível em economia de deflação severa ou períodos muito curtos onde inflação acumulada supera média da SELIC.

Regulamentação Pendente do Conselho Monetário Nacional

Lei 14.905/2024 não especifica exatamente como deduzir correção monetária quando termos iniciais de juros e correção divergem significativamente. Questões abertas incluem:

(i) Qual índice de inflação deduzir (IPCA, INPC, IGP-M)? (ii) Como operar quando juros incidem desde data anterior mas correção desde data posterior? (iii) Metodologia de cálculo em períodos muito curtos?

Aguarda-se regulamentação complementar do Conselho Monetário Nacional quanto à operacionalização precisa. Até tal clarificação, recomenda-se cautela em cenários complexos.


Impactos em Estruturação Contratual Prospectiva

Cláusulas de Taxa de Juros: Clareza Prospectiva

Para contratos celebrados a partir de 3/7/2024, recomenda-se clareza expressa quanto ao regime de juros moratórios. Alternativas estruturais incluem:

(i) Remissão expressa a Lei 14.905: “Juros moratórios conforme taxa legal estabelecida em Lei 14.905/2024” — estrutura simples, adapta-se automaticamente a futuras alterações legislativas, mas cria dependência de lei;

(ii) Fixação de taxa específica: “Juros moratórios de X% ao ano” — estrutura rígida, imune a mudanças legislativas, mas potencialmente desatualizada;

(iii) Parametrização a SELIC com dedução: “Juros moratórios equivalentes à SELIC, deduzida correção monetária conforme Lei 14.905/2024” — estrutura que encoraja conformidade com lei, mas requer precisão técnica.

Escolha depende de: (i) duração contratual esperada; (ii) necessidade de previsibilidade; (iii) capacidade de renegociação posterior.

Cláusulas de Atualização Monetária: Separação Conceitual

Importante que cláusulas de correção monetária não se confundam com cláusulas de juros moratórios. Recomenda-se:

(i) Clareza de distinção: Diferenciar expressamente “atualização monetária” (reposição de inflação) de “juros moratórios” (compensação pela mora);

(ii) Escolha de índice: Indicar expressamente qual índice (IPCA, IGP-M, outro) para atualização monetária;

(iii) Evitar cumulação: Estruturar de forma que não se acumulem SELIC (que já incorpora juros + correção) e correção monetária adicional separada — isto seria dupla remuneração;

(iv) Períodos de incidência: Especificar com clareza em que data cada componente começa a incidir.

Cláusulas de Transição Normativa: Proteção Bilateral

Para contratos de longa duração que podem atravessar futuras alterações legislativas, recomenda-se:

(i) Clausula de revisão: “Se lei posterior alterar regime legal de juros moratórios, partes renegociarão cláusula de boa-fé”;

(ii) Alocação de risco: Decidir claramente: quem arca com risco de futuras mudanças legislativas? Credor (absorve redução de remuneração se SELIC diminuir) ou devedor (absorve aumento se SELIC aumentar)?

(iii) Mecanismo de ajuste: Indicar como e quando contrato se ajusta, ex.: “A cada 12 meses, partes avaliam necessidade de ajuste conforme mudanças normativas”.

Tais cláusulas protegem ambas as partes contra insegurança de futuras alterações.


Questões Jurídicas Não Resolvidas

Dedução de Correção em Termos Iniciais Distintos

Problema técnico persiste: quando juros moratórios incidem desde uma data (ex.: citação em junho de 2023) e correção monetária desde outra (ex.: sentença em outubro de 2024), como deduzir correção monetária do período posterior a 3/7/2024?

Exemplo específico: Se juros incidem desde 01/06/2023 e correção desde 15/10/2024, o período 04/07/2024 a 14/10/2024 apresenta juros incidindo mas correção ainda não. Como deduzir correção de período onde ainda não há correção sendo aplicada?

Lei 14.905/2024 não oferece solução completa. Aguarda-se orientação do Conselho Monetário Nacional.

Aplicação a Sentenças Transitadas em Julgado

Sentença que fixou 1% ao mês acrescido de IPCA, já transitada em julgado, não sofre alteração automática pela Lei 14.905/2024. A coisa julgada material protege a decisão.

Alteração exigiria ação rescisória (artigo 966 do CPC), cujos pressupostos rigorosos não se adequam a simples mudança de jurisprudência ou legislação superveniente.

Consequência: substancial acervo de sentenças anteriores permanecerá indefinidamente sob regime de 1% ao mês acrescido de IPCA.

Operacionalização em Períodos Muito Curtos

Quando período de mora é brevíssimo (semanas ou dias), acumulação de SELIC é negligenciável, resultando em valor próximo a zero. Questão de praticidade: quando operacionalizar cálculo em período tão breve?

Ainda não há resposta oficial. Prática pode vir a aceitar arredondamento para zero ou negligenciamento, mas isto não está regulamentado.


Análise Macroeconômica: Impactos do Novo Regime

Realinhamento de Incentivos Comportamentais

Para credores: Remuneração potencialmente reduzida (SELIC com dedução versus 1% ao mês acumulado) gera incentivo aumentado a buscar acordos pré-litigiosos. Se recuperação judicial resulta em montante substancialmente menor, negociação direta torna-se mais atrativa, frequentemente com maior probabilidade de efetivo recebimento.

Para devedores: Capacidade de adimplemento aumenta. Montante devido ordinariamente inferior reduz incentivo a litígio perpétuo, estimulando cumprimento de sentença.

Para sistema financeiro: SELIC governa integralidade do sistema financeiro. Quando Poder Judiciário aplica SELIC a dívidas civis com mesmo rigor que sistema financeiro, elimina anomalia anterior onde juros civis superavam rentabilidade de operações financeiras de baixíssimo risco, reduzindo fragmentação normativa e incrementando confiança institucional.

Implicações para Mercado de Crédito

Precificação de operações: Instituições financeiras que concedem crédito cotidianamente precificam operações baseadas em SELIC. Se juros judiciais forem inferiores a SELIC, reduz-se incentivo a litigância judicial como substituição a operações financeiras.

Isto tendencialmente reduz pressão sobre sistema judicial e incrementa utilização de mecanismos extrajudiciais de cobrança.

Custo de capital: Empresas que calculam custo de capital esperado em litigância incorporam expectativa de juros. Redução desses juros reduz custo esperado de litigância, podendo reduzir spread de operações de crédito (maior volume esperado de recuperação, menor taxa de risco).

Competitividade: Instituições financeiras e operadores de cobrança que se adaptarem rapidamente a novo regime logram vantagem competitiva. Aquelas que demorarem em reconhecer impacto ficarão com carteiras subavaliadas.

Estabilidade Econômica Nacional

Aspecto macroeconômico fundamental: a Lei 14.905/2024 alinha Poder Judiciário com política monetária do Banco Central.

Quando tribunais impõem remuneração divergente de SELIC, criam fragmentação normativa que complexifica ambiente de negócios, gera desconfiança institucional e impede que empresa saiba exatamente qual será seu custo de capital em litigância.

Realinhamento promove segurança econômica, reduz incerteza, facilita planejamento financeiro corporativo.

Comportamento em Cenários de Volatilidade Inflacionária

Em período de inflação alta: SELIC tipicamente aumenta para conter inflação. Portanto, remuneração de juros civis via SELIC também aumenta, oferecendo proteção automática a credores em período de inflação elevada.

Em período de inflação baixa: Inversamente, SELIC reduz, e remuneração de juros civis reduz correspondentemente.

Este comportamento automático cria estabilizador contracíclico: em período inflacionário, remuneração é maior; em período de deflação ou inflação baixa, remuneração é menor.

Tal estrutura é mais sofisticada que taxa fixa de 1%, que não se adapta a cenários econômicos variáveis.


Impactos em Gestão de Passivos Judiciais

Reavaliação de Carteiras de Contas a Receber

Instituições e empresas com carteiras substanciais de dívidas judiciais devem proceder reavaliação conforme novo regime.

Metodologia essencial:

Identificar período de cada dívida e segmentá-lo conforme 3 de julho de 2024. Períodos anteriores usam STJ Tema 1368; posteriores usam Lei 14.905. Recalcular montantes aplicando SELIC conforme regime correto para cada segmento. Comparar com valores anteriores para quantificar impacto (redução típica de 20-40% em períodos de 5 ou mais anos) e atualizar expectativa de recebimento.

Impacto é particularmente significativo em carteiras antigas, onde redução acumulada é mais substancial.

Atualização de Políticas de Provisão Conforme Normas Contábeis

Conformidade contábil é imperativa. Empresas devem revisar como constituem provisões de acordo com normas aplicáveis.

CPC 25 / IAS 37 (Empresas que adotam IFRS)

O CPC 25 espelha integralmente o padrão internacional IAS 37 — Provisões, Passivos Contingentes e Ativos Contingentes.

Norma exige que provisão seja constituída quando: (i) existe obrigação presente resultante de evento passado; (ii) é provável que desembolso será necessário; (iii) estimativa confiável pode ser feita.

Impacto Lei 14.905: Alteração no cálculo de “estimativa confiável” — o montante esperado de desembolso reduz porque SELIC com dedução é ordinariamente inferior a 1% + IPCA.

Isto demanda:

  • Revisão de premissas atuariais

  • Recalcolo de valor presente de obrigações

  • Reconhecimento de variação de estimativa (conforme CPC 23)

  • Divulgação em notas explicativas de mudança metodológica

BR GAAP Tradicional (Empresas que não adotam IFRS)

Empresas em regime tradicional (BR GAAP) que adotam Lei 6.404/1976 constituem provisões sob regras da Lei das Sociedades Anônimas.

O CPC 25 oferece orientações conceituais similares, ainda que Lei 6.404 seja menos prescritiva tecnicamente.

Impacto Lei 14.905: Mesmo impacto conceitual — redução de montante esperado, necessidade de revisão de provisões anteriores e reconhecimento de alteração de estimativa.

Recomenda-se que empresas BR GAAP constem com assessoria contábil para implementação adequada.

Impacto em Demonstrações Financeiras

Reavaliação de provisões gera impacto direto no resultado do exercício:

  • Redução de provisão: Reconhece-se ganho (reversão de despesa anterior), incrementando lucro

  • Impacto no fluxo de caixa: Melhora perspectiva de fluxo futuro

  • Impacto em índices de alavancagem: Redução de passivos melhora razão passivo/patrimônio

Tal impacto é ordinariamente positivo (incremento de resultado), mas demanda transparência em divulgação.

Renegociação de Operações em Curso

Redução de montante due via Lei 14.905 oferece oportunidade estratégica para credores renegociarem com devedores antes que reavaliação completa ocorra.

Estratégia possível: Oferecer desconto por antecipação de pagamento antes que jurisprudência consolide novo regime. Isto gera: (i) certeza de recebimento; (ii) redução de passivo do devedor (que quer evitar reavaliação futura); (iii) benefício mútuo.

Tal renegociação pré-judicial reduz litigância, alinha com incentivos macroeconômicos mencionados anteriormente.


Conformidade Contábil: CPC 25 e IFRS 9 no Contexto de Lei 14.905/2024

CPC 25 / IAS 37 — Provisões e Mensuração

O CPC 25 é tradução integral das normas internacionais IAS 37. Empresas que adotam IFRS aplicam diretamente estas orientações. Empresas que adotam BR GAAP tradicional aplicam Lei 6.404/1976, com regras conceitualmente similares, embora menos prescritivas tecnicamente.

Conformação contábil: Provisão conforme CPC 25 é mensurada pela melhor estimativa do desembolso necessário para liquidar a obrigação. Quando lei altera regime de juros moratórios, altera-se a “melhor estimativa”. Se SELIC com dedução é menor que regime anterior, provisão deve ser reduzida.

Tal redução reconhece-se como variação de estimativa contábil, com impacto direto no resultado do exercício. Empresas devem divulgar em notas explicativas: motivo da mudança, alteração legislativa e impacto quantitativo no resultado.

IFRS 9 — Instrumentos Financeiros e Mensuração de Perdas Esperadas

O IFRS 9 (e correspondente CPC 48) disciplina mensuração de instrumentos financeiros, incluindo contas a receber, com modelo de mensuração de perdas esperadas (modelo de perda esperada em vida do ativo).

Modelo de Perda Esperada: Entidade reconhece perda por redução de valor antes que crédito seja efetivamente perdido, baseando-se em estimativa de perdas futuras prováveis.

Classificação de Risco conforme IFRS 9:

  • Categoria 1: Crédito sem deterioração significativa de risco; perda esperada de 12 meses

  • Categoria 2: Crédito com deterioração significativa de risco, mas sem evidência de insolvência; perda esperada de vida inteira do ativo

  • Categoria 3: Crédito em insolvência; perda esperada de vida inteira do ativo

Impacto de Lei 14.905: Quando lei altera regime de juros, altera-se estimativa de fluxo de caixa esperado de contas a receber. Se SELIC com dedução produz fluxo menor, reduz-se expectativa de recuperação, afetando cálculo de perda esperada.

Empresas devem revisar seus modelos de perda esperada e recalcular redução de valor considerando novo regime.

Custo de capital: IFRS 9 desconta fluxos esperados à taxa apropriada (ordinariamente taxa de mercado para operação similar). Se operação usa SELIC como referencial de fluxo esperado, e SELIC foi reduzida via Lei 14.905, fluxo presente reduz, reduzindo valor contábil do ativo.

Integração entre CPC 25 e IFRS 9

Ambas as normas reconhecem impacto de lei sobre valor de obrigações. O reconhecimento simultâneo em provisão (passivo) e em redução de valor de contas a receber (ativo) produz efeito integrado nas demonstrações financeiras.

Quando Lei 14.905/2024 reduz montante esperado de juros, ambos os lados da demonstração contábil refletem essa alteração de forma consistente.


Links Internos e Continuidade da Série

Retorno ao Artigo 1: Para compreensão aprofundada da fundamentação jurídica de por que SELIC é a taxa legal consolidada pelo STJ Tema 1368, e para esclarecimento de questões de coisa julgada em sentenças anteriores, consulte “STJ Tema 1368: Consolidação Jurisprudencial da SELIC como Taxa Legal de Juros Moratórios em Relações Civis“.

Aprofundamento no Artigo 2: Para operacionalização prática de cálculos de SELIC em diferentes cenários, incluindo exemplos numerados e metodologia passo-a-passo, consulte “Como Calcular SELIC em Dívidas Civis: Metodologia Prática com Fundamentação Conceitual“.


Assessoria Especializada

A implementação completa de Lei 14.905/2024 demanda coordenação entre análise jurídica precisa e conformidade contábil rigorosa. Reavaliação de carteiras de passivos judiciais, atualização de políticas de provisão conforme CPC 25 / IFRS 9, e estruturação de contratos prospectivos constituem operações de considerável complexidade técnica.

A Barbieri Advogados mantém equipe multidisciplinar composta por advogados especialistas em direito civil e contadores com ampla expertise em cálculos judiciais, gestão de dívidas civis e conformidade contábil. Disponibilizamos assessoria para revisão de passivos judiciais, reestruturação de carteiras de crédito conforme novo regime normativo, estruturação de cláusulas contratuais prospectivas e suporte técnico em conformidade com CPC 25 e IFRS 9.


Autor: Maurício Lindenmeyer Barbieri Advogado inscrito na OAB/RS sob nº 36.798, Sócio da Barbieri Advogados

O presente estudo constitui análise técnico-jurídica de caráter informativo. Para questões específicas relacionadas a casos concretos, recomenda-se