Inventário Negativo: Instrumento de Segurança Jurídica para Herdeiros

16 de outubro de 2025

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Introdução

O inventário negativo constitui procedimento formal destinado a comprovar a inexistência de patrimônio deixado pelo falecido. Embora não previsto expressamente em lei, o instituto é amplamente reconhecido pela doutrina e praxe forense, conforme consolidado pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (Apelação Cível nº 50370678520198210001, 8ª Câmara Cível, 2022).

Diferentemente da declaração constante na certidão de óbito, o inventário negativo produz efeitos jurídicos específicos, constituindo instrumento essencial para regularização da representação do espólio e proteção patrimonial dos herdeiros contra responsabilização além das forças da herança.


Fundamento Jurídico e Admissibilidade

A admissibilidade do inventário negativo decorre da interpretação sistemática do ordenamento jurídico. O artigo 610, §1º, do CPC estabelece que o inventário será processado ainda que o autor afirme inexistirem bens, princípio que fundamenta o procedimento negativo.

“Ainda que não exista previsão legal, a doutrina e a jurisprudência admitem o processamento de inventário negativo quando há necessidade de regularização da representação do espólio em outros processos judiciais, bem como para dar certeza acerca da inexistência de bens a transmitir à sucessão.”
(Apelação nº 50027347320208210001, 8ª Câmara Cível, TJRS, 2021)

O interesse jurídico relevante dos herdeiros justifica o procedimento, permitindo a nomeação de inventariante que representará judicialmente o espólio, culminando com sentença declaratória de inexistência de bens.


Certidão de Óbito x Inventário Negativo

A jurisprudência do TJRS estabelece clara distinção entre a declaração na certidão de óbito e o inventário negativo formal.

“Certidão de óbito em que consta que a de cujus não deixou bens” constitui “documento insuficiente para fins de extinguir o feito executivo.”
(Agravo de Instrumento nº 53211529620248217000, 4ª Câmara Cível, TJRS, 2024)

“A via adequada para a comprovação cabal da inexistência de bens seria a apresentação de um inventário negativo, judicial ou extrajudicial, documento que possui a finalidade específica de atestar formalmente a ausência de patrimônio a partilhar.”
(Apelação Cível nº 50018552620238210045, 25ª Câmara Cível, TJRS, 2025)

A certidão de óbito possui presunção iuris tantum de veracidade, podendo ser contestada por credores. O inventário negativo, por sua vez, constitui prova robusta e formal da inexistência patrimonial.


Responsabilidade dos Herdeiros e Proteção Patrimonial

O inventário negativo assume relevância fundamental na delimitação da responsabilidade sucessória. Conforme o artigo 1.997 do Código Civil, os herdeiros respondem pelas dívidas do falecido até o limite do quinhão hereditário.

“A responsabilidade pelas dívidas do falecido recai exclusivamente sobre o acervo hereditário, não se estendendo ao patrimônio pessoal dos herdeiros.”
(Agravo nº 51826244820258217000, 20ª Câmara Cível, TJRS, 2025)

As constrições judiciais “somente podem recair sobre os bens do espólio do falecido, não podendo atingir valores existentes nas contas pessoais de seus sucessores.”
(Agravo nº 50262500420258217000, 11ª Câmara Cível, TJRS, 2025)

O inventário negativo formaliza esta proteção, demonstrando documentalmente a inexistência de acervo hereditário e impedindo questionamentos futuros sobre eventual ocultação patrimonial.


Situações que Demandam o Procedimento

Legitimação Processual

Herdeiros frequentemente necessitam comprovar a condição de sucessores e a inexistência de patrimônio para regularizar a representação processual do espólio em demandas judiciais. Sem o inventário formal, enfrentam dificuldades para demonstrar legitimidade e limitação de responsabilidade.

Execuções Fiscais e Cíveis

Execuções em curso contra o falecido podem ser redirecionadas aos herdeiros. O inventário negativo constitui defesa processual eficaz, comprovando formalmente a inexistência de patrimônio executável e protegendo o acervo pessoal dos sucessores.

Regularizações Administrativas

Órgãos públicos, instituições financeiras e registros públicos exigem comprovação formal sobre o destino do patrimônio do falecido. O inventário negativo atende estas exigências de forma definitiva.


Procedimento e Aspectos Práticos

O inventário negativo pode ser processado judicial ou extrajudicialmente.
Na via extrajudicial, lavra-se escritura pública em Tabelionato de Notas, com a presença de todos os herdeiros maiores e capazes, assistidos por advogado.

Documentos necessários:

  • Certidões negativas de propriedade (imóveis, veículos, contas);
  • Certidão negativa de testamento;
  • Declaração do advogado sobre diligências realizadas;
  • Pesquisas em registros públicos, instituições financeiras e órgãos de trânsito.

O procedimento requer verificação cuidadosa da efetiva inexistência de bens, assegurando que o inventário negativo reflita com precisão a situação patrimonial do espólio.

💡 Dica prática: Quando houver processos em andamento, a nomeação de inventariante — mesmo no inventário negativo — facilita a representação do espólio e evita nulidades por ausência de legitimidade.


Efeitos Jurídicos Consolidados

  • Prova formal qualificada: superior à mera declaração isolada;
  • Proteção contra execuções: demonstra inexistência de patrimônio executável;
  • Regularização sucessória: formaliza a sucessão mesmo sem bens;
  • Segurança jurídica: previne questionamentos futuros sobre ocultação de bens;
  • Limitação de responsabilidade: documenta a inexistência de forças da herança.

Conclusão

O inventário negativo, embora não previsto expressamente em lei, constitui instituto jurídico consolidado pela jurisprudência gaúcha. Sua formalização transcende mera cautela, configurando instrumento indispensável de proteção patrimonial dos herdeiros e regularização sucessória.

A Barbieri Advogados assessora este procedimento com expertise técnica, assegurando a adequada proteção dos sucessores através da formalização judicial ou extrajudicial do inventário negativo.