Institutos processuais: A GARANTIA DO CONTRADITÓRIO E SEU CONTEÚDO

23 de junho de 2025

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Maurício Lindenmeyer Barbieri

Mestre em Direito Processual pela UFRGS.

Quando se diz que o procedimento legitima o resultado do exercício do poder, tem-se em vista agora o modelo de ser dos procedimentos que o direito positivo oferece e que constituem o penhor da lei à preservação dos princípios constitucionais do processo, a começar pelo contraditório. Se algum procedimento excluísse a participação dos sujeitos envolvidos no litígio, ele próprio seria ilegítimo e chocar-se-ia com a ordem constitucional.

Cândido Rangel Dinamarco

INTRODUÇÃO

Em nossas discussões sobre processo, cada vez mais deixamos a visão de processo como instrumento meramente técnico e passamos a ter presente a idéia que o processo é essencialmente um instrumento político, que reflete, em cada momento histórico, o perfil ideológico do Estado¹.

Nessa perspectiva, o direito processual só pode ser compreendido na perspectivas dos valores constitucionalmente consagrados².

O Direito Processual Civil, ramo do direito público, é regido por normas que se encontram na Constituição Federal e na legislação infraconstitucional. Nesse contexto insere-se o princípio do contraditório³, sem sombra de dúvida um dos mais relevantes princípios processuais constitucionais.

1. ASPECTOS HISTÓRICOS

Necessariamente, quando se pretende buscar as origens da constitucionalização do processo, somos remetidos ao exame da cláusula do devido processo legal, pois ela reúne a um só tempo, diversas garantias constitucionais do processo.

Sua origem remonta à Magna Charta de João Sem Terra⁴, no ano de 1.215, que significou a consagração de uma série de privilégios obtidos pelo baronato inglês em face de um monarca debilitado em seu poder político. No seu art. 39 temos o embrião do que viria a ser o princípio do devido processo legal.

Assim, numa primeira fase, o que se tinha era a garantia formal de um julgamento conforme a law of the land (costumes e princípios locais), sem que houvesse, todavia, garantia quanto ao conteúdo do processo a ser aplicado. Assegurava-se, apenas, a preexistência das normas reguladoras do procedimento, era, pois, o direito a um julgamento qualquer⁵⁶.

Com o passar do tempo o conceito passou a incorporar princípios elementares como o de ser citado e de defender-se. Talvez com resquício desta postura, a idéia de que o acusado deve ter um fair trial (ser tratado com lealdade no processo) e a idéia de que não se pode estatuir senão observando as formas de um processo regular (the rules of natural justice) são idéias centrais do direito inglês, direito concebido sob um aspecto essencialmente contencioso, mais preocupado com a administração da justiça do que propriamente com a justiça em si mesma. Segui um processo bem regulado, cheio de lealdade – pensa o jurista inglês – chegareis quase seguramente a uma solução de justiça. O jurista do sistema romano-germânico pensa ao contrário, que é necessário dizer ao juiz qual é a solução de justiça; se o juiz conhece esta solução, não se deve impedi-lo de chegar a ela, regulamentando com excessiva minúcia o processo e as provas⁷.

Estas atitudes foram, obviamente, determinadas pela história. A atitude inglesa estabeleceu-se naturalmente num país onde não havia um corpo de direito em que se basear, e em que os juízes foram levados a construir empiricamente a common law⁸. A atitude da família romano-germânica explica-se, ao contrário, pela recepção, ou pelo menos pelo prestígio do direito romano o qual aceitamos a herança.

Robert Winess Millar⁹ lembra que a concepção originária do juízo como submissão voluntária de uma controvérsia a resolução por uma autoridade superior, não dava lugar a um procedimento contra o demandado que se negava a comparecer. Em consequência, antes do pretor romano introduzir um recurso admitindo o uso da missio in bona com medida para forçar o comparecimento, o direito romano carecia de autoridade para ditar sentença contra o demandado que se negava a comparecer, seja voluntariamente ou sobre a coação física do autor¹⁰. A idéia de que o tribunal poderia considerar a causa na ausência do demandado, se este notificado não comparecer, tem sua origem no procedimento contumacial do direito romano pós-clássico¹¹.

2. PRINCÍPIOS PROCESSUAIS-CONSTITUCIONAIS

A ciência processual moderna fixou, através de laboriosa e fecunda evolução, os princípios fundamentais que dão forma e caracterizam os sistemas de processo. Através de uma operação de síntese crítica, focaliza-se os preceitos, onde esses princípios são consagrados, e os seus respectivos corolários, bem como a coadunação de tais regras, em um ordenamento estatal, com outros princípios jurídicos e com as necessidades sociais e políticas do Estado em que vigoram¹²¹³.

O estudo de alguns desses princípios se situam no limiar da dogmática processual, ou seja, nos lindes desta com a zona deontológica que as normas do direito positivo são examinadas à luz de cânones éticos e políticos. Daí a denominação, dada por alguns a esses postulados e preceitos informativos, de princípios políticos do processo¹⁴.

E isto se explica, a toda evidência, pelo do influxo das normas político-constitucionais¹⁵ na estruturação do direito processual. A constituição age sobre o processo, garantido-lhe os princípios básicos, para que o processo possa, depois, atuar convenientemente os preceitos e garantias que ela própria contém e que projeta sobre todo o ordenamento jurídico. A bipolaridade dessas influências associa-se, naturalmente, ao conhecimento do poder que os juízes exercem, como guardas da Constituição e responsáveis pela sua interpretação fiel e cumprimento estrito. Assim inserido nas estruturas estatais do exercício do poder, o juiz é legítimo canal através do qual o universo axiológico da sociedade impõe as suas pressões destinadas a definir e precisar o sentido dos textos, a suprir-lhes eventuais lacunas e a determinar a evolução do conteúdo substancial das normas constitucionais¹⁶.

No cenário das instituições jurídicas do país, o procedimento tem o valor de penhor de legalidade no exercício do poder. A lei traça o modelo dos atos do processo, sua sequência, seu encadeamento, disciplinando com isso o exercício do poder e oferecendo a todos a garantia de que cada procedimento a ser realizado em concreto terá a conformidade com o modelo preestabelecido: desvios e omissões quanto a esse plano de trabalho e participação, constituem violações à garantia constitucional do devido processo legal¹⁷.

Isso não significa que o due process of law se resolva em mera garantia de legalidade. O que importa é a estrutura de oportunidades e de respeito às faculdades e poderes processuais, que a constituição e a lei impõem ao juiz que comanda o processo. A observância da lei torna-se importante, nesse contexto, como meio de preservar o devido processo inserido nessa estrutura.

No contexto processual bastante amplo afirmado pela doutrina moderna, due process of law é mais do que uma garantia é o conjunto de garantias constitucionais que de um lado, asseguram às partes o exercício de suas faculdades e poderes processuais e, de outro, são indispensáveis ao correto exercício da jurisdição¹⁸. Na sua redução mais sintética, é uma garantia de justiça e consiste no direito ao processo, ou seja, direito ao serviço judicial corretamente prestado e às oportunidades que o conjunto de normas processuais constitucionais oferece para a defesa judicial de direitos e interesses¹⁹.

O processo, como conjunto de atos deve ser estruturado contraditoriamente, como imposição do devido processo legal que é inerente a todo sistema democrático onde os direitos do homem encontram garantias eficazes e sólidas.

Assim ocorre porque os preceitos de relevância processual tem natureza de normas de garantia, ou seja, de normas colocadas pela Constituição como garantia das partes e do próprio processo. Consectário lógico desta assertiva é que a invalidade do ato praticado será proveniente da própria Constituição ou dos princípios gerais do ordenamento ali estabelecidos.

As garantias constitucionais-processuais, mesmo quando aparentemente postas em benefício da parte, visam em primeiro lugar o interesse público na condução do processo segundo as regras do devido processo²⁰. Dessarte, esta garantia não pode ser vista na ótica exclusiva de direitos subjetivos das partes e, sim, como fator legitimante do exercício da própria função jurisdicional. Isso representa um direito de todo o corpo social, interessa ao próprio processo para além das expectativas das partes e é condição inafastável para uma resposta imparcial, legal e justa²¹.

Nessa dimensão garantidora das normas constitucionais-processuais, não sobra espaço para a mera irregularidade sem sanção. A atipicidade constitucional, no quadro das garantias, importa sempre uma violação a preceitos maiores, relativos à observância dos direitos fundamentais e as normas de ordem pública²².

Contudo, não é suficiente para a legitimação do poder a observância dos princípios constitucionais processuais, ou somente a presença dos valores processuais. Se o processo é instrumento que serve ao direito material não é legitimo o processo que realiza um direito discriminador ou desatento aos valores do Estado Democrático de Direito. Ora, o democrático”, inserido na expressão, qualifica o Estado, o que irradia os valores da democracia sobre todos os elementos que o constituem e, assim sobre a ordem jurídica. O Direito, portanto, é permeado por tais valores, e o seu conteúdo deve ser buscado no sentimento popular e no interesse coletivo²³. Dessarte, não basta afirmar que é garantido o contraditório em um procedimento desenhado para favorecer posições que não podem ser privilegiadas²⁴ em face dos valores da Constituição. É necessário que o procedimento também esteja de acordo com o devido processo legal no sentido substantivo²⁵.

3. DIALÉTICA PROCESSUAL

Dialética²⁶ é uma “espécie” do gênero diálogo. O campo da dialética é o direito processual. O direito processual não foi, contudo, uma eleição, mas uma consequência. E ele o guardião da dialética, em seu sentido originário, a arte do diálogo, da discussão regrada²⁷.

O diálogo então é próprio do homem, por natureza um animal social. A dialética — Arte do diálogo regrado – confronta pontos de vista, objeto de uma controvérsia determinada²⁸. No processo, esse regramento deve submeter-se ao objetivo comum, a pesquisa do justo²⁹.

O campo da eleição dialética é outro problema, em cujo âmbito se manifestam opiniões divergentes. É o território das objeções, que nada mais representam senão opiniões lançadas ao debate em face do problema. A dialética move-se, portanto, na opinião dos pontos de vista, procurando estabelecer as “regras do jogo” que deverão presidir as relações entre os intervenientes da discussão. Em Direito, a dialética se manifesta no processo³⁰, especialmente no plano normativo (CF de 1988, art. 5º, inciso LV). Sem contraditório, nenhum processo – é já uma determinação constitucional. Uma vez posta em estado de questionamento (quaestio juris et facti) e recortada à questão pela regra da pertinência, o processo governa o seu movimento dialético pela audiência das partes (auditur et altera pars)³¹.

É assim a dialética processual. Em primeiro lugar temos a afirmação de uma realidade (tese), sua negação (antítese), e finalmente, a negativa ou da afirmação ou da negação. E, no processo, a dialética não se limita a operar no palco abstrato, mas atua no plano do concreto, exprimindo a participação dos dois sujeitos do procedimento cognitivo³²³³. Nesse sentido é que se fala da dialética do processo, valendo ainda lembrar que o que se intenta é remontar de uma ou de várias hipóteses de verdade.

Surge daí uma inarredável conclusão: as partes são necessárias para o desenvolvimento do processo. Devem representar os interesses opostos com relação à definição e qualificação do fato declarado. A parcialidade destes é essencial a função jurisdicional no momento da análise, assim como no momento da síntese é essencial a imparcialidade do juiz. Daí a afirmação de Tito Camacini, no sentido de que se il processo serve alle parti, alla loro volta le parti servono al processo³⁴.

A correspondência e equivalência assinaladas influenciam a própria estrutura do procedimento, necessariamente dialética, e devem condizer ainda com a dinâmica dialética do processo. Vale dizer, com outras palavras, que a simetria, mútua implicação e substancial paridade das posições subjetivas traduzir-se-á na possibilidade de cada um dos participantes intervir de forma não episódica e no exercício de um conjunto de controles, reações e escolhas, bem como a necessidade de submissão aos controles e reações alheias³⁵³⁶.

4. PRINCÍPIO DA IGUALDADE

Constitucionalmente consagrado o princípio da igualdade³⁷ perante a lei traz, como consequência, o princípio de igualdade das partes no processo³⁸. Dentro das necessidades técnicas do processo, deve a lei propiciar ao autor e réu uma atuação processual em plano de igualdade³⁹. No processo de conhecimento, essa igualdade⁴⁰ deve consistir em dar a ambas as partes análogas possibilidades de alegações e provas.

A igualdade pode ser vista sob seu aspecto meramente formal, contrapondo-se à igualdade material. E pode ser vista sob o ângulo do esforço de transformação de igualdade formal em igualdade material. O que significa em outras palavras, que a igualdade tem uma dimensão estática e outra dinâmica. Na dimensão estática, o axioma de que todos são iguais perante a lei parece configurar, como foi observada, mera ficção jurídica, no sentido de que é evidente de que todos são desiguais — como na denúncia de George Orwell, em seu Animal Farm: “Onde todos os animais são iguais, uns são mais iguais que os outros” — mas esta patente desigualdade é recusada pelo legislador. A isonomia supera assim, as desigualdades, para afirmar uma igualdade meramente jurídica⁴¹.

Na dimensão dinâmica, porém verifica-se caber ao Estado suprir as desigualdades para transformá-las em igualdade real. O contraditório não se identifica com igualdade estática, aquela puramente formal, das partes no processo; não exprime a simples exigência de que os sujeitos possam agir em plano de paridade; nem determina ao juiz o mero dever de levar em conta a atividade de ambos, permitindo que façam ou até deixem de fazer alguma coisa. O contraditório, como contraposição dialética paritária e forma organizada de cooperação no processo, constitui o resultado da moderna concepção da relação jurídica processual, da qual emerge o conceito de igualdade de armas.

5. PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO

O processo é, antes de tudo, um instrumento através do qual o poder é exercido, já que hoje se compreende que todo poder é exercido através de um procedimento, que se caracteriza como processo desde que seja realizado em contraditório. Existe processo quando, em uma das fases do iter de formação de um ato, é contemplada a participação não só do seu autor e réu, mas de todos destinatários dos seus efeitos, em contraditório⁴².

A essência do princípio do contraditório exige que dele participem pelo menos dois sujeitos, um “interessado” e um “controinteressado”: sobre um dos quais o ato final é destinado a desenvolver efeitos favoráveis e sobre outros efeitos prejudiciais⁴³.

Luigi Paolo Comoglio⁴⁴, sinalou alguns aspectos do contraditório, o qual considerou como

“meio essencial para a realização do escopo típico do processo, garantindo que o acertamento e atuação do direito controverso venha sobre um plano de igual defesa de partes. Impõem-se a plena regularidade não só da instauração, mas também do sucessivo desenvolvimento do juízo e da pronúncia da decisão definitiva. Tende-se a colocar em evidencia a estreita relação que incorre entre a garantia de um efetivo contraditório e a exigência de participação ativa de todas as partes no debate processual e no exercício do direito de defesa deste, como expressão essencial da personalidade humana, considerada como sujeito (não como objeto) de um processo “equo” e justo. Nesta ótica, se a participação das partes nos atos do processo e sobretudo nas fases em que se adquirem elementos instrutórios, garante o exercício de direito fundamental, assegurando assim a genuidade da prova adquirida, correlacionando-se de modo indissolúvel ou os princípios de emparcialidade e independência do juiz que é chamado a pronunciar-se”.

Esse contraditório⁴⁵ amplamente entendido há de ser pleno e efetivo, indicando a real participação das partes na relação jurídica processual. E, plenitude e efetividade do contraditório indicam a necessidade de se utilizar todos os meios necessários para evitar que a disparidade de posições no processo venha a incidir sobre seu êxito, condicionando-o a uma distribuição desigual de forças. A quem age e a quem se defende em juízo devem ser asseguradas às mesmas possibilidades de obter a tutela de suas razões⁴⁶.

No Brasil, a garantia do contraditório processual-penal sempre mereceu consagração, expresso ou tácita, nos textos constitucionais até 1969⁴⁷, a partir de 1988, a Constituição ampliou sua abrangência garantindo aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os recursos e meios a ela inerentes” (art. 5º, LV); assim, hoje a garantia do contraditório é inerente a todo tipo de processo⁴⁸.

Todavia, conquanto irrestrito no processo de cognição amplo e exauriente, o princípio pode sofrer algumas limitações com a sumarização do processo de conhecimento e ainda no processo de execução e cautelar, afeiçoando-se à finalidade e estrutura da função processual. A história do direito processual esta repleta de exemplos de coarctação do princípio da audiência bilateral⁴⁹.

No processo de execução não se pode considerar o executado mero sujeito passivo da execução, cabe-lhe todo direito de nela participar para fiscalizar seu andamento, evitando abusos e concorrendo para a sua realização de acordo com os ditames da lei e da justiça, sendo assim indiscutível ocorrer aí também o contraditório⁵⁰. Em face da peculiaridade estrutural dessa função processual, trata-se de um contraditório parcial quanto aos temas submetidos ao diálogo entre as partes e, além disso, atenuado, porque limitado os poderes probatórios e de asserção das partes e restritos os provimentos do juiz.

O princípio do contraditório é inerente às partes litigantes – autor, réu, litisdenunciado, opoente, chamado ao processo, assistente e ao Ministério Público. Todos aqueles que tiverem alguma pretensão de direito material a ser deduzida no processo tem direito de invocar o princípio do contraditório em seu favor. Os contendores têm direito de deduzir suas pretensões e defesas, realizarem as provas que requereram para demonstrar a existência de seu direito, em suma, direito de serem ouvidos paritariamente no processo em todos os seus termos.

No processo administrativo igualmente incide o contraditório⁵¹. No Estatuto da Criança e Adolescente o processo administrativo para apuração de ato infracional cometido por criança e adolescente, é informado pelo contraditório e ampla defesa, pois seu objetivo é a aplicação de medida sócio-educativa pela conduta infracional, que se assemelha à imposição de sanção administrativa. Igualmente, os procedimentos de Direito Desportivo, aos quais, a teor do art. 30, do Decreto 981 de 11 de novembro de 1993, que regula a Lei nº 8.672, de 06 de julho de 1993, “Lei Zico” que institui Normas Gerais sobre Desportos⁵²⁵³.

Nelson Nery Jr. adverte que nos procedimentos de jurisdição voluntária, é preciso que se tenha em conta não se tratar de observar o contraditório em seu aspecto técnico processual, de dar aos litigantes igualdade de chances, porque não existem partes em sentido técnico aliado ao fato de que o princípio inquisitório ser o que preside os procedimentos de jurisdição voluntária⁵⁴.

No processo de execução, seja com os embargos de devedor, seja com a presença de exceção de pré-executividade, ou ainda através de alegação de outra questão de ordem pública⁵⁵. Na mesma esteira, sobre todo e qualquer ato praticado no processo de execução, deve dar-se oportunidade ao devedor de falar (ex: atualização de um cálculo, ordem de preferência na penhora). Nota-se a limitação do contraditório no processo de execução, limitação esta, oriunda da própria natureza do processo de execução⁵⁶⁵⁷.

Há, contudo, limitação imanente à bilateralidade da audiência no processo civil, quando a natureza e a finalidade do provimento jurisdicional almejado ensejarem a necessidade de concessão de medida liminar, inaudita altera pars, como é o caso da antecipação dos efeitos da tutela (art. 273, CPC), do provimento cautelar ou das liminares em ação possessória, mandado de segurança, ação coletiva e ação civil pública. Isto não quer significar, entretanto, violação do princípio constitucional, portanto a parte terá oportunidade de ser ouvida intervindo posteriormente no processo, inclusive com direito a recurso contra a medida liminar concedida sem sua participação. Aliás, a própria provisoriedade dessas medidas implica a possibilidade de sua modificação posterior por interferência da manifestação da parte contraria, por exemplo⁵⁸.

Existe toda uma trama de incertezas, probabilidades e riscos no direito processual. Para aumentar a segurança e com isso, a austeridade da Justiça, possibilitando decisões e soluções mais justas e adequadas ao direito material, é que se dispõe da garantia do contraditório como instrumento de que se vale o legislador para evitar os riscos de medidas que não estejam de acordo com os juízos axiológicos de toda a sociedade. O preceito audiatur et altera pars, é, e continua a ser aquele que manifesta a exigência de provocar o contraditório, essencial ao caráter bilateral da demanda e da pluralidade do sujeitos interessados no procedimento. A possibilidade de diálogo anteriormente a formação do provimento e a possibilidade de poder fazer as próprias razões em posição de simétrica paridade, representa uma exigência imprescindível de respeito à garantia constitucional do contraditório⁵⁹. Este é o conteúdo da garantia do contraditório.

6. CONTRADITÓRIO EM DIREITO PROBATÓRIO

A prova no processo civil é usada com o objetivo de acertar os fatos no âmbito do processo, o direito de produzir prova engloba o direito à adequada oportunidade de requerer sua produção, o direito de participar da sua realização e o direito de falar sobre os seus resultados⁶⁰. No caso de prova determinada de ofício vale o mesmo, pois a parte não só tem o direito de sobre ela se pronunciar, mas também o direito de participar da sua realização⁶¹.

Toda e qualquer atividade instrutória há de ser produzida em contraditório. Nesta perspectiva a regra do contraditório manifesta uma série de implicações, entre as quais assumem particular relevo na aquisição e na valoração da prova em vista da decisão sobre o fato. Ainda sobre este ponto, aparece a função de garantia do contraditório como meio de oferecer controle, disponível às partes, sobre o uso de provas por parte do juiz⁶².

Com efeito. A regra do contraditório pode funcionar antes de tudo como controle da determinação do material probatório carreado com fim de constituir base para a decisão. Bem como introduzir no processo prova destinada a confirmar uma versão do fato diversa ou contraditória à dedução da prova contrária tendente a fornecer elementos de confronto e contradição. O contraditório, como garantia da parte atua como importante elemento de controle no procedimento de formação da prova. Uma ulterior função de controle ainda ocorre quando este tem como finalidade influir sobre a valoração das provas por parte do juiz⁶²⁶³.

A garantia do contraditório significa, antes de mais nada, que a ambas as partes há de se conceder iguais oportunidades de pleitear a produção de provas. Não deve haver disparidade de critérios no deferimento ou indeferimento dessas provas pelo órgão jurisdicional⁶⁴. Também significa que as partes terão as mesmas possibilidades de participar dos atos probatórios e de pronunciamentos sobre os seus resultados.

A exigência do contraditório, na formação e produção de provas, vem sendo desdobrada, na experiência jurisprudencial e na lição doutrinária, em diversos aspectos, como resume Guiseppe Tarzia⁶⁵: a) a proibição de utilização de fatos que não tenham sido previamente introduzidos pelo juiz no processo e submetidos a debate pelas partes; b) a proibição de utilização de provas formadas fora do processo ou de qualquer modo colhidas na ausência das partes c) o dever do juiz, que disponha de poderes de ofício para a admissão de um meio de prova, de permitir às partes, antes de sua produção, apresentar os meios de prova que pareçam necessários em relação aos primeiros; d) o dever de permitir a participação dos interessados na produção das provas.

Em última análise, tanto será viciada a prova que for colhida sem a presença do juiz, como será a prova que for colhida pelo juiz sem a presença das partes. De igual sorte inválida é a prova produzida sem a presença do juiz. Isso ocorre como consectário lógico do princípio do juiz natural e da impossibilidade de integração extrajudicial do contraditório.

A presença das partes também é condição para a validade das provas. A garantia não significa apenas que a parte possa defender-se contra as provas apresentadas contra si, exigindo-se, ainda, que seja colocada em condição de participar de sua produção, assistindo as que forem colhidas de ofício pelo juiz. É que tudo quanto for utilizado sem a prévia intervenção e participação das partes acaba sendo deduzido ao conhecimento privado do juiz.

Aplicam-se, tais princípios, a todos os meios de prova em direito admitidos⁶⁶. Com relação aos depoimentos, igualmente, não se poderá admitir exceções, visto inclusive estar erigido em norma supranacional pela Convenção Européia dos Direitos do Homem, que reconhece ao acusado o direito de inquirir ou fazer inquirir as testemunhas.

Pelo que já foi dito, não pode pairar qualquer sombra de dúvida quanto a intransponível necessidade de qualquer documento juntado aos autos ser cientificado as partes, para a observância do contraditório. Assim o é, por que ao documento oferecido por qualquer uma das partes ou por qualquer outra razão junto aos autos, sempre será licito opor outro documento, capaz de invalidá-lo, contrariá-lo ou esclarecê-lo.

Os mesmos princípios aplicam-se com relação às perícias. Importante destacar que a pericia⁶⁷, qualquer que seja a natureza que se lhe atribua, deve ser produzida sob o pálio do contraditório, com toda e qualquer atividade que sirva para preparar o espírito do juiz e consequentemente, a “instruir”. Conclui-se, pois, que a contraditoriedade é garantida na instrução, entendida em sentido amplo, para nela se compreenderem todas as atividades de cognição processual.

7. O JUIZ E O PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO

De nada serviria assegurar às partes o direito à prova, se o juiz pudesse deixar de apreciá-la e valorá-la, no momento do julgamento⁶⁸. Daí, todas as provas e alegações das partes devem ser objeto de acurada análise e avaliação, sob pena de infringência do referido princípio⁶⁹.

Trata-se de assegurar o direito que tem as partes de ser ouvidas e ver examinadas pelo órgão julgador as questões que houverem suscitados. Essa prerrogativa deve entender-se ínsita no direito de ação, que não se restringe, segundo a concepção hoje prevalente, à mera possibilidade de por em movimento o mecanismo judicial, mas inclui a de fazer valer razões em juízo de modo efetivo e, por conseguinte, de reclamar do órgão judicial a consideração atenta dos argumentos e provas trazidos aos autos.

A razão da necessidade de motivar pode ter dois enfoques distintos. A mais antiga atém-se a razões exclusivamente técnicas, endoprocessuais, restritas as partes às quais se assegura o direito de conhecer as razões da decisão para adequadamente impugná-la, e aos órgãos judiciais de segundo grau para dar-lhes meios de controlar a justiça e legalidade das decisões submetidas a sua revisão⁷⁰.

Frise-se que entre as iniciativas práticas do dever de motivar,Tentar novamente

ML

Por favor, continueEditar

inserem-se inquestionavelmente o direito das partes de serem ouvidas e verem apreciadas as questões suscitadas, as provas e as razões aduzidas, o que representa desdobramento das garantias do direito de ação de defesa e do contraditório, satisfeitos agora pelo direito à avaliação dos argumentos e provas carreados aos autos. Daí à parte da motivação da sentença, apresenta-se como o mais válido ponto de referência para verificar se a atividade defensiva foi efetivamente respeitada⁷¹.

Uma vez proposta a demanda, fica concedido poderes instrutórios ao juiz, subtraindo da parte o poder de disposição formal do processo, devendo as partes aportar a necessária colaboração para aquisição de material probatório. Daí, evidenciando a falta de nítida e rígida repartição de funções entre as partes e o órgão judicial, temos na verdade um entrelaçamento de ambas as atividades, com mútua colaboração, tanto na pesquisa dos fatos quanto na valoração jurídica da causa⁷².

A colaboração só se ostenta possível se as partes sabem ou possam saber de que depende, no caso concreto, o ponto de vista do órgão judicial. De modo nenhum é admissível sejam as partes surpreendidas por decisão que se apóie, em ponto decisivo numa visão jurídica de que não se tenham apercebido, ou considerada sem o maior significado: deve-se dar as partes conhecimento de qual direção o direito material corre perigo⁷³⁷⁴. Permitir-se-á apenas o aproveitamento, na sentença, dos fatos sobre os quais as partes tenham tomado posição. Isso ocorre mesmo em matérias as quais deva o juiz pronunciar-se de ofício, sob pena de infringência da garantia⁷⁵.

Nessa perspectiva, o princípio deve ter por conteúdo também a oportunidades concedidas às partes para se manifestarem, em prazo razoável, sobre as questões de fato e de direito essenciais para a decisão das causa, pouco importando que seu exame decorra de decisão voluntária do órgão judicial ou por imposição da regra iura novit curia.

O que foi dito implica, no essencial, a idéia de recíproco condicionamento e controle da atividade das partes e da atividade do órgão judicial, a apontar à dupla função assumida pelo contraditório: por um lado garantir a igualdade entre as partes: por outro, satisfazer o interesse público na descoberta da verdade e realização da justiça. Assim concebido, não se pode deixar de reconhecer também no contraditório um poderoso fator de contenção do arbítrio do juiz⁷⁶.

8. A EFETIVIDADE DO CONTRADITÓRIO JUDICIAL

O regime democrático significa, acima de tudo, participação. A participação no poder é da essência da democracia e o que legitima seu exercício. O fundamento de legitimidade do processo jurisdicional não poderia ser diferente. O exercício do poder estatal através do processo jurisdicional há de ser legítimo, mas a legitimidade do exercício do poder somente pode ser conferida pela abertura à participação. Ora, se o processo jurisdicional deve refletir o Estado Democrático de Direito, a idéia básica do processo deve ser a de garantir aos interessados uma interação efetiva no procedimento que vai levar à edição da decisão⁷⁷. A participação no processo jurisdicional, portanto, está vinculada à idéia de efetividade do contraditório⁷⁸.

Assim o é por que a legitimidade do exercício da jurisdição está ligada a uma possibilidade real, e não meramente formal, de participação⁷⁹. Esta não ocorrendo efetivamente no processo⁸⁰ ter-se-á configurado violação contra aquilo que se tem de mais essencial no processo jurisdicional⁸¹. Assim define-se por contraditório, de um lado a necessidade de levar a conhecer a existência da ação e dos atos do processo às partes, e, de outro, a possibilidade destes reagirem aos atos que lhe forem desfavoráveis. Os contendores têm direito de deduzir suas pretensões e defesas, produzir as provas que requereram para demonstrar a existência de seu direito, em suma, direito de serem ouvidos em igualdade em todos os termos do processo.

A efetividade do contraditório é exigência deste e graduada conforme o teor da indisponibilidade do direito substancial em conflito. Os dois pólos dessa garantia, a informação e a reação correspondem a dois postulados de maior espectro do próprio Estado Democrático, que são a liberdade de informação e a participação da sociedade. Tem-se informação para melhor participar. No processo, é assegurada a informação sempre e, quando o direito é disponível, a reação dos atos do adversário e do próprio juiz dependerá das opções da parte, que cumprirá os ônus ou sofrerá as consequências. Por outro lado, na medida da indisponibilidade do direito substancial, estreita-se a disponibilidade das situações ativas no processo, de modo que da não participação deixem decorrer as consequências mais graves que se tem em caso de direitos disponíveis⁸².

Por outro lado, o contraditório ha de ser equilibrado, combatendo os litigantes em igualdade de armas; essa é a projeção processual do princípio constitucional da isonomia que ilumina todo o procedimento mediante o qual se exterioriza a participação contraditória⁸³.

A efetividade do Princípio do Contraditório também se reflete na congruência de prazos fixados, na lei processual a fim de colocar o interessado em condições de conhecer o dies a quo e de utilizar, em sua inteireza, o tempo que lhe foi concedido. O prazo estabelecido em lei deve adequar-se ao desempenho das atividades defensivas, de modo que, em concreto, leve a efetiva possibilidade de tutela⁸⁴⁸⁵.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  1. Segundo Nicolò Trocker, Processo Civile e Costituzione, Studi di Diritto Comparato a cura di Mauro Cappelletti, Milano, Giuffrè Editore, 1974, p. 94 observa-se no pós-guerra em diversos países do mundo que se utilizou a Constituição como instrumento mais válido para instaurar uma nova ordem político e social e para oferecer uma resposta historicamente às ansiosas interrogações do momento em diversos países do mundo. Também Luigi Paolo Comoglio em palestra proferida na II Jornada Brasileira de Direito Processual Civil, Brasília, 14 de agosto de 1997, sobre o tema Os modelos de Garantias Constitucionais do Processo, lembra que nas principais Convenções Internacionais e Constituições da Europa, determinou-se uma série de garantias atinentes à função jurisdicional e ao processo – em particular aquelas atinentes à função jurisdicional e ao processo — em particular aquelas derivadas dos mais significativos princípios de natural justice (habitualmente descritos nos brocardos latinos: meno judex sine adore, ne eat judex ultra petita et alligata partium, nemo judex sine adore, ne eat judex ultra petita et aliegata partium, nemo judex in causa sua, audiatur et altera pars, nemo inauditus dammari potest) — foram progressivamente se impondo como “fundamentais” e “invioláveis”, no contexto geral dos direitos e das liberdades pessoais do indivíduo, em virtude de uma contingente necessidade jurídico-política.
  2. No magistério de Joaquim Gomes Canotilho, Procedimento, Processo e Organização, Boletim da Faculdade de Coimbra, p. 192: “Reconhece-se, hoje, sem grandes objeções, aos direitos fundamentais a natureza de “máximas processuais” direta ou indiretamente determinadoras da conformação do processo. (…) A força determinadora imediata dos direitos fundamentais significa que estes influenciam, de forma direta, a posição jurídico material dos indivíduos perante os tribunais. (…) A determinação mediata, embora não se possa descrever através de fórmulas gerais, significa, positivamente, a obrigatoriedade de conformação do processo de acordo com os direitos, liberdades e garantias, e, negativamente, a proibição da estruturação processual em violação dos direitos materiais. Mais adiante reconhece o citado autor que os direitos processuais fundamentais “garantem, tal como os outros direitos e liberdades, posições jurídicas subjetivas e possuem, por consequência, a natureza de direitos de defesa perante os poderes públicos. Tal como outros direitos, transportam também uma dimensão objetivo-institucional, funcionando como princípios jurídicos objetivos para a conformação da organização dos tribunais e do processo judicial.”
  3. Segundo Robert Winnes Millar, Los Principios Formativos del Procedimiento Civil, trad. Catalina Grassmann, Ediar, Buenos Aires, este constitui-se “El más destacado de los principios cuestionados acaso sea el concepto de que han de ser oídas ambas partes: el principio de la audiencia bilateral (Grundsatz des beiderseitigen Gehoers).“Inseparável em absoluto da administração da Justiça organizada, encontra igual expressão no preceito romano: auditur et altera pars e no provérbio em rima da Alemanha medieval; “Eines mannes, red ist Keine red, der richter soll die dell verhoerem deed” (A alegação de um só homem não é alegação, o Juiz deve ouvir a ambas as partes.)
  4. Sálvio de Figueiredo Teixeira, O Processo Civil na Constituição, RP 59 (1989) p. 79. “Nullus liber homo capiatur vel imprisionetur aut disseisetur libero tenemento suo vel libertatibus, vel liberis consuestudinibus suis, aut utlagetur, aut exuletur, aut aliquo modo destruatur, nec super eo ibimus suis, aut utlagetur, aut exuletur, aut aliquo, modo destruatur, nec super eo ibimus, nec super eum mittemus, nisi per legale judicium parium suorum, ver per legem terrae.
  5. Já na Bíblia, quando Deus, no momento de expulsar Adão, chamou; “Adamo, ubi est” Ele sabia onde estava Adão, mas perguntou-o, chamou-o.
  6. O termo hoje consagrado, due process of law, foi utilizado somente em lei inglesa de 1354, baixada no reinado de Eduardo III, denominada Statute of the Liberties of London, assim disposto “None shall be condemned without trial. Also, that no man, of what estate or condicion that he be, shall be put out of the land or tement, nor taken or imprisoned, nor disinherited, nor put to death, without being brought to aswer by due process of law.
  7. Nelson Nery Jr., Princípios do Processo Civil na Constituição Federal, 4ª ed., RT, São Paulo, p. 29 lembra que antes mesmo da Constituição Federal Americana, de 1787, algumas constituições estaduais já garantiam o due process of law, entretanto, somente a “Declaração dos Direitos” de Maryland, de 03.11.1776, que fez pela primeira vez referência expressa ao trinômio, hoje insculpido na Constituição Federal Norte-Americana, vida- liberdade-propriedade, dizendo em seu inciso XXI que “that no freman ought to be taken, or imprisoned, or disseized of his freehold, liberties, or privilegies, or outlawed, exiled or any manner destryed, or deprived of his life, liberty, or property, by the judgemente of his peer, or by the law of the land.
  8. David, René, Os Grandes Sistemas do Direito Contemporâneo, Tradução Martins Fontes, São Paulo, 1996, p. 19 ainda lembra o mesmo autor: “A common law foi formada pelos juízes, que tinham de resolver litígios particulares, e hoje ainda é portadora, de forma inequívoca, da marca desta origem. A regra de direito da common law, menos abstrata que a regra de direito da família romano-germânica, é uma regra que visa dar solução a um processo, e não formular uma regra geral de conduta para o futuro.”
  9. Walter Habscheid, As Bases do Direito Processual Civil, RP (1978) 11-12/140 lembra que relativamente ao princípio do contraditório a sistemática da doutrina anglo-saxônica cinde o direito de ser ouvido num right to notice — direito à ciência da demanda – do right to be heard (direito de ser ouvido), ambos os elementos necessários de um julgamento justo (fair trial), traduz de maneira imperfeita no direito de cada parte de obter um conhecimento adequado dos atos processuais realizados contra ela e um direito de tomar conhecimento dos próprios atos.
  10. Robert Wines Millar, ob. cit., p. 47.
  11. Segundo o mesmo autor, este também foi o procedimento utilizado no Direito Canônico, exercia-se coação sobre o autor mediante coação sobre o demandado através do desterro, excomunhão, colocando o autor na posse dos seus bens (possessio tedialis) e medidas análogas.
  12. Robert Wines Millar, ob. cit, p. 51, afirma que nos Tribunais Ingleses, até a Common Law Procedure Act (lei sobre o procedimento de direito escrito) de 1852, os tribunais que originariamente somente poderiam exercer coação contra a pessoa do demandado, passaram a ter o direito de sequestrar seus bens e, a partir daí adquiriram jurisdição para ditar contra o demandado ausente, um ato que lhe dava como confesso da versão apresentada pelo autor (decreto pro confesso)
  13. José Frederico Marques, Instituições de Direito Processual Civil, Rio de Janeiro, Forense, 3ª ed., V. II, p. 93.
  14. Walter Habscheid, As Bases do Direito Processual Civil, RP (11-12)/119 lembra que o processo civil é uma instituição do Estado. O estado encarna a organização social, o direito processual reflete as idéias éticas, ideológicas e políticas que caracterizam uma dada sociedade. Consequentemente, o direito processual civil não pode e não deve ser considerado de forma isolada, mas, na verdade, englobado em tais idéias e concepções, que se expressam na ordem constitucional. Aproximarmo-nos do direito processual, sem levarmos em consideração tais fundamentos, significaria fechar os olhos diante do fato de que ele (o direito processual) é um dos domínios do direito, onde as bases do “sistema” se refletem mais claramente.
  15. José Frederico Marques, ob. cit, p. 94. O processo civil brasileiro esta preso e ligado aos imperativos jurídico-constitucionais, de ordem genérica, de um sistema estatal moldado nos postulados da Democracia, ou melhor dizendo: da legalidade democrática. Os cânones fundamentais de seu sistema não podem fugir por isso de obrigatório enquadramento no espírito da lei maior.
  16. José Joaquim Gomes Canotilho, Direito Constitucional, Livraria Almedina, Coimbra, 1991, 5ª ed., p. 61, lembra que na Idade Média assistimos ao desenvolvimento da lei fundamental. “Nos primeiros tempos, corresponde à sedimentação, em termos vagos, de um conjunto de princípios ético-religiosos e de normas consuetudinárias ou pactícias, que vinculavam reciprocamente o rei e as várias classes sociais, não podendo ser violadas pelo titular do poder soberano.”
  17. Cândido Rangel Dinamarco, A Instrumentalidade do Processo, São Paulo, Malheiros, 5ª ed., revista e atualizada, p. 41.
  18. Cândido Rangel Dinamarco, A Instrumentalidade do Processo, São Paulo, Malheiros, 5ª ed. revista e atualizada, p. 131,
  19. Como já notara José Frederico Marques, Ensaio sobre a Jurisdição Voluntária, 2ª ed., São Paulo, Saraiva, 1959, p. 24, “A importância da Constituição, no tocante ao processo, é das maiores, não só porque na Lei Básica se acham regras que o legislador ordinário não pode violar, como também porque o “processo” concebido como garantia de justiça, nada mais significa que a imediata e direita complementação dos mandamentos constitucionais.” mais adiante, p. 25 ” (…) o Direito Processual Civil tem por pressupostos os princípios jurídicos da Constituição, não só no que tange com a atividade judiciária e a estrutura dos respectivos órgãos, como também no que diz respeito às relações do indivíduo com o poder estatal em que se encarnam as funções jurisdicionais.”
  20. Como bem acentua Cândido Dinamarco, Fundamentos do Processo Civil Moderno, São Paulo, RT, 1987, 2º ed., p. 85, na relação entre o Estado e a População existem garantias individuais asseguradas no âmbito constitucional e existem regras para que cada um conheça previamente a medida da interferência do Estado na sua esfera de direitos, a medida da autoridade do Estado na sua esfera de direitos, a medida da autoridade do Estado, e conheça também as formas pelas quais ele exerce este poder. Então, nas medidas do e nas formas do exercício do poder, o próprio Estado se autolimita.
  21. Grinover, Ada Pelegrini, As Nulidades no Processo Penal, São Paulo, Malheiros, 3ª ed., p. 19/20.
  22. Grinover, Ada Pelegrini, ob. cit., p. 20.
  23. Assim afirma Ada Pellegrini Grinover, ob. cit., p. 20 “Toda vez que houver infringência a princípio ou norma constitucional-processual que desempenhe função de garantia, a ineficácia do ato praticado em violação à Lei Maior será a consequência que surgirá da própria Constituição ou dos princípios gerais do ordenamento. (…) Tratar-se-á apenas de verificar se o ato deve ser considerado juridicamente inexistente ou simplesmente nulo e, a partir daí, se a ineficácia acompanhará o não-ato, desde seu aparente nascimento, ou se seguirá à declaração de nulidade”
  24. José Afonso da Silva, Curso de Direito Constitucional Positivo, São Paulo, Malheiros, 1995, 10ª ed., p.120.
  25. Não se pode olvidar que alguns procedimentos permitem a participação em contraditório, mas acabam privilegiando, à distância do princípio da igualdade, determinadas posições, como o Dec. Lei 70/66, que permite verdadeira justiça de mão própria. Nessa matéria: Carlos Alberto Álvaro de Oliveira, Procedimento e Ideologia no Direito Brasileiro Atual, Ajuris, v. 43.
  26. Luiz Guilherme Marinoni, Novas Linhas do Processo Civil, São Paulo, Malheiros, 2ª ed. revista e ampliada, p. 144.
  27. Dialética é o discurso do provável. Sua característica basilar é o entrechoque de opiniões, partindo-se de simples opiniões indemonstradas mas confiáveis.
  28. José Souto Maior Borges, O Contraditório no Processo Judicial (uma visão dialética). São Paulo, Malheiros, p. 13.
  29. Justamente esta perspectiva dialética procurou-se resgatar nas reformas do Código de Processo Civil de Portugal, conforme nos noticia Miguel Teixeira de Souza, obra citada, busca-se uma racionalidade comunicativa e privilegia o diálogo entre os sujeitos processuais. A lógica da informação e da cooperação sobrepõe-se à lógica do disputa e da estratégia. Essa abertura à dialética e a retórica, também se nota no elemento linguístico da reforma. Basta lembrar o frequente recurso a cláusulas gerais e a conceitos indeterminados, com a “igualdade substancial das partes”, “o prudente arbítrio”, “prudente convicção acerca de cada fato” ou a “especial complexidade da causa”. A ponderação e a razoabilidade, que são elementos indispensáveis à concretização destas clausulas gerais e conceitos indeterminados, tornam-se importantes parâmetros da decisão.
  30. Como bem nota José Souto Maior Borges, ob. cit, p. 72, “a verdade jurídica ama ocultar-se. O processo é clareira aberta e que se oferece à luz, sob as matas ocupadas da ocultação originária. Os atos processuais tendem, no fundo, a desobstruir a via para a verdade de fato. Cada ato processual é como uma réstia de luz que penetra na clareira margeada pela densidade da floresta, onde se abriga a escuridão, porque a luz mal consegue atravessá-la.”
  31. Colesanti, Vittorio, Principio del Contradittorio e Procedimenti, Rivista di Diritto Processuale, Anno XXX, nº 4, Il diritto del convenuto di contraddire mediante eccezioni e difese, p. 582, Come espressione della struttura dialettica del procedimento, in conformità al (normale) cattere bilaterale della domanda, mediante il contraddittorio si vuole assicurare la partecipazione al procedimento di formazione dell’atto giurisdizionale di coloro che ne saranno i destinatari; a bem vedere, nel contradittorio si concreta la dialettica del processo, perché il provedimento “non può essere emanato se della domanda non sia edotto, in una con il giudice, l’altro destinatário, e cioè colui o coloro nei confronti dei quali la domanda viene proposta.
  32. José Souto Maior Borges, ob. cit., p. 70.
  33. José Souto Maior Borges, ob. cit, p. 76.
  34. Tito Camacini, Tutella giurisdizionale e técnica del processo, in Studi in onore di Enrico Redenti, Milano, Giuffrè, 1951, p. 700. Trata-se, portanto, de garantia fundamental de imparcialidade, legitimidade e correção da prestação jurisdicional: sem que o diálogo entre as partes anteceda o pronunciamento estatal, a decisão corre o risco de ser unilateral, ilegítima e injusta; poderá ser um ato de autoridade, jamais de verdadeira justiça.
  35. Carlos Alberto Álvaro de Oliveira, Do Formalismo no Processo Civil, São Paulo, Saraiva, 1997, pág. 114.
  36. José Frederico Marques, Instituições de Direito Processual Civil, ob. cit, p. 90. Não se compreende que só a pretensão do autor mereça a tutela jurisdicional. A resistência do réu traduz, em ultima ratio, a defesa de um interesse alheio. O sujeito passivo, que resiste, pode ser apontado na relação jurídica afirmada na pretensão, com autor da lesão a direito individual que motivou a propositura da ação. No entanto, se a lesão afirmada não se verificou, reconhecê-la com os seus consectários. seria lesar os interesses e os direitos dos sujeitos passivos da pretensão. Ora, não se compadece com a isonomia, e com os princípios da tutela jurisdicional, um tratamento unilateral no processo isso seria mesmo a sua negação, e uma contradictio in se ipsa, pois se a exceção é resultado da bilateralidade da ação, deve haver o mesmo tratamento ao sujeito da ação e da exceção.
  37. Celso Antônio Bandeira de Melo, O conteúdo jurídico do princípio da Igualdade, São Paulo, Malheiros, 3ª ed., 1997, vale mencionar algumas conclusões apontadas pelo autor de situações que ocorreria ofensa ao preceito constitucional da isonomia, quando: I – A norma singulariza atual e definitivamente um destinatário determinado, ao invés de abranger um categoria de pessoas, ou uma pessoa futura e indeterminada II — A norma adota, como critério discriminador, para fins de diferenciação de regimes, elemento não residentes nos fatos, situações ou pessoas por tal modo desequiparadas. É o que ocorre quando pretende tomar o fator “tempo”, que não descansa no objeto – como critério diferencial III — A norma atribui tratamento jurídico diferentes em atenção a fator de discrímen adotado que, entretanto, não guarda relação de pertinência lógica com a disparidade de regimes outorgados. IV -A norma supõe relação de pertinência lógica existente em abstrato, mas o discrímen estabelecido conduz a efeitos contrapostos ou de qualquer modo dissonantes dos interesses prestigiados constitucionalmente V — a interpretação da norma extrai dela distinções, discriminações, desequiparações que não foram professadamente assumidas, por ela de modo claro, ainda que por via implícita.
  38. Segundo Nicolò Trocker, na ob. cit., onde o autor apresenta um enfoque constitucional do processo civil, o autor sustenta que a igualdade constitui sua projeção no processo civil sob o aspecto do contraditório. Por sua vez, Cândido Rangel Dinamarco, Fundamentos do Processo Civil, p. 91, entende não haver perfeita coincidência entre isonomia e contraditório. A igualdade das partes, pela qual o juiz vela no processo, está no art. 125 do Código; a igualdade se projeta não só a nível de princípio do contraditório. A igualdade está presente em tudo o que se refere aos poderes, aos deveres, digamos direitos das partes no processo: igualdade de prazos para recorrer; igualdade de oportunidades para recorrer; igualdade de oportunidades em geral no processo. (…) O contraditório, por sua vez, nem sempre esta ligado à idéia de igualdade. (…) Se considerarmos, por exemplo, que o poder de recorrer é uma expressão do contraditório e que a Fazenda Pública e o Ministério Público têm prazos maiores do que as outras partes, isso poderia significar que a igualdade esta sendo violada e, no entanto, há o princípio do contraditório. (…) Não há inteira coincidência entre igualdade e contraditório. São conceitos diferentes. Embora se encontrem politicamente, são conceitualmente diferentes.
  39. Na ordem processual, o art. 125, do CPC dispõe que “o juiz dirigirá o processo, conforme as disposições deste código, competindo-lhe: I – assegurar às partes igualdade de tratamento.
  40. Miguel Teixeira de Souza, Estudos sobre o novo processo civil, Lisboa, Lex, 2ª ed., pág. “O direito ao contraditório — que é, em si mesmo, uma decorrência do princípio da igualdade das partes estabelecido no art. 3º – A possui um conteúdo multifacetado: ele atribui à parte não só o direito ao conhecimento de que contra ela foi proposta uma acção ou requerida uma providência e, portanto, um direito à audição antes de ser tomada qualquer decisão, mas também um direito a conhecer todas as condutas assumidas pela contraparte e a tomar posição sobre elas, ou seja, um direito de resposta.” (…) “O direito de resposta consiste na faculdade, concedida a qualquer das partes, de responder a um acto processual (articulado, requerimento, alegação ou acto probatório) da contraparte.”
  41. Quem tratar do contraditório a partir da ótica do liberalismo do século XIX descreverá o princípio como uma garantia de conteúdo formal. Porém essa perspectiva está superada e enterrada pela nossa própria Constituição, e é necessário que o Direito se ajuste aos anseios de justiça social, é evidente que o princípio do contraditório não pode ser compreendido a partir da idéia de igualdade formal. O princípio do contraditório, como se pode perceber, não se identifica com o princípio da igualdade; esse último apenas o colore. O princípio do contraditório na atualidade, deve ser desenhado com base no princípio da igualdade substancial, já que não pode se desligar das diferenças sociais econômicas que impedem a todos de participar efetivamente do processo. Se buscamos efetividade no contraditório, não temos como fugir da investigação de uma série de temas, problemas e institutos destinados a tornar possível uma participação real, e não apenas ilusória, dos litigantes no processo.
  42. Elio Fazzalari, Novíssimo Digesto Italiano, Verbete Procedimento e Processo (teoria generale). p. 821 Como já dissemos, o conceito de procedimento com participação em contraditório está ligado à necessidade da legitimação do poder pela participação (efetiva e adequada) que possibilita a legitimação do exercício do poder do Estado, ver também Cândido Dinamarco, A Instrumentalidade do Processo, ob. cit., p. 126 e segs.
  43. A expressão é utilizada por Elio Fazzalari, Novíssimo Digesto Italiano, Procedimento e Processo (teoria generale), Torino, UTET, 1982, pág. 819.Para individuar o processo, entendido como uma série de normas, posições e atos, coligados entre si, exurge o contraditório realizado no procedimento em igualdade de condições. Lembra o mesmo autor que em todos os tipos de processo o contraditório se articula mediante normas -faculdades, poderes, deveres e atos — iguais por conteúdo e número, que podem se predisposto pela lei de forma qualitativa e quantitativamente diversa, ainda mais em razão do tipo e da natureza do ato processual.
  44. Difesa e Contraddittorio nei Procedimenti in Camera di Consiglio, Rivista di Diritto Processuale, Ano LII, 1997, pág. 744.
  45. Friedrich Lent, Trattato del Processo Civile, Napoli, Morano Editores, 1962, lembra que pelo princípio do contraditório é dado a qualquer um o direito de defender-se. Sendo fato próprio de todos os ordenamentos processuais civilizados, e encontra reconhecimento expresso no art. 103 G.G.. A pretensão de ser escutado é assim um direito fundamental, com a consequência de que sua violação é motivo de impugnação constitucional (.B. Verf. GG parag. 90). É que como bem menciona Ugo Rocco, Trattato di Diritto Processuale Civile, UTET, Editrice Torinense, 1957. p. 300″Anche il convenuto ha, quindi, un diritto di pretendere dal guidice l’acertamento dei concreti raporti guiridici sostanciali dedotti in guidizio a cui corrisponde um obbligo guiridico deglio organi guirisdizionali al rendimento delia prestazione giurisdizionali. (…) Per assecurare la soddisfazione degli interessi tutelali dal diritto, e solo di quegli interessi tutelati dal diritto; pera assecurare a soddisfazione di essi, nei limiti e nella misura stabiliti dal diritto, senza invadere la sfera di liberta riconosciuta all’indivíduo, sacrificando, quindi, altri interessi tutelati dal dirtto, le norme processuali riconoscono al convenuto una pretesa di fronte agli organi giurisdizionali, la quale assume una forma anlitetica alle pretesa dell’attore (contraddizione).
  1. Como sintetiza Luigi Paolo Comoglio, Difesa e Contradittorio nel procedimenti in Camera di Consiglio, Rivista di Dirritto Processuale, Anno LII, Luglio-Settembre 1997, p. 747, “In ogni caso, occorre non transcurare mai il fatto che il conlradditorio è strumento, attuativo del diritto di agire e di resistere in guidizio, rientrando nel più ampio diritto alla tutela guirisdizionale, a sua volta ascrivible “nel sua núcleo più ristretto ed essenciale”fra i diritti inviolabili dell’uomo e tra i principi supremi dell’ordinamento constituzionale. Ne discende ima conseguenza di particolare rilievo, nel contesto del nostro tema. Se, infatti, sia pur nelle forme particolarii di ciascun rito speciale, viene constantemente rispettato qual “núcleo ristretto ed essenciale” del diritto alla tutela – atraverso la predispozicione di um mínimo di contraddittorio (orale o scritto) e di un possibile confronto dialético tra le parti, in funcione dei dirritti di azione, di difesa e de prova spettanti a ciascuna di esse (…)” Na Itália, o Princípio do Contraditório ancora-se no art. 101 do diploma processual onde “Il giudice, salvo che la legge disponga altrimenti, non può statuire sopra alcuna domanda, se la parte contro la quale è proposto non è stata regolannente citata e non à comparsa.” Elio Fazzalari, Enciclopédia, Verbete Principio del Contradittorio, p. 721, adverte ser a manifestação do aspecto formal do princípio.
  2. Na ordem constitucional anterior, segundo a interpretação consolidada do Supremo Tribunal Federal, o contraditório era uma garantia apenas do processo penal. Não se pode olvidar que processualistas de nomeada, como Ada Pelegrini Grinover e Cândido Dinamarco, entre outros, bradavam pela ideia de que a participação contraditória, na instrução deveria ser entendida de forma ampla, não limitando-se apenas ao processo penal.
  3. Antônio Magalhães Gomes Filho, O Direito à Prova no Processo Penal, São Paulo, RT, p. 137, lembra o autor que a Constituição imperial de 1824, assegurava tão somente a nota de culpa, através da qual o juiz devia fazer constar ao réu o motivo da prisão (art 179, 8º), a partir do texto republicano de 1891, passou-se a fazer referência a ampla defesa (art 72, parág. 16), igualmente constante na Carta de 1934 (art 113, 24); em 1937, menciona-se, pela primeira vez, que a instrução criminal será contraditória, asseguradas as necessárias garantias da defesa (art 122, 11); e essa dupla garantia (defesa e contraditório) figurou nas Cartas de 1946 (art 41, parag. 25), 1967 (art 150, parág. 15 e 16) e 1969 (art 153, parág. 15 e 16).
  4. Carlos Alberto Álvaro de Oliveira, Do formalismo no Processo Civil, São Paulo, Saraiva, 1997 entre os exemplos, menciona o autor as “injunctions” temporais e as “receivership orders” do processo norte americano, as medidas provisórias (“eistweilige Verfügungen“) do direito alemão previstas em caso de urgência, as ações modernas derivadas da “operis muntiatio” romana, a “saisie conservatoire” do direito francês, o “sequestro conservativo” italiano e o “Arresprozess” alemão. Nessa enumeração podem ainda ser incluídos os chamados “instrumenta guarentigiata” (predecessores do atual juízo executivo por títulos extrajudiciais), pelos quais o devedor concedia ao seu credor o direito de proceder à execução sem ser previamente ouvido, e o juizo monitório alemão (“Mahnverfahren“) derivado do direito germânico medieval, que permite ao tribunal emitir, a pedido do autor e sem a prévia ciência do demandado, uma ordem de pagamento (“Zahlungsgebot“), destinada a ficar sem efeito se o sedizente devedor comparece e contesta a pretensão.
  5. Carlos Alberto Álvaro de Oliveira, Do Formalismo no Processo Civil, São Paulo, Saraiva, 1997, p. 121. A possibilidade de aforamento da ação incidental de embargos, bem como de suscitar-se questões atinentes às condições da ação e aos pressupostos processuais e dos atos processuais como avaliação do bem penhorado, regularidade de editais.etc.
  6. Odete Medauar, A Processualidade no Direito Administrativo, São Paulo, RT, 1993, p. 97. A noção de contraditório vinha tradicionalmente associada ao processo jurisdicional; sua admissibilidade na esfera administrativa representa uma mudança de algumas concepções relativas à supremacia do Estado, à existência de um só juizo sobre o interesse público, à posição do administrado como súdito, servil e submisso, à predominância absoluta da autotutela (…) os recursos, reclamações, denúncias administrativas supõem quase necessariamente um conflito de interesses entre o requerente, de um lado, e o órgão autor do ato, de outro e isto desemboca bem concretamente numa impugnação que não é outra coisa senão contenda: daí a indispensável discussão plena do assunto, com ataque e prova, mediante um procedimento imparcial, público, etc. (…) A idéia de contraditório em procedimentos administrativos ganha terreno também à medida que a atenção se volta para a relação Administração-administrados e que se buscam meios para circunscrever a atuação administrativa dentro de parâmetros, com o fim de refrear abusos.
  7. Art. 30. Aos Tribunais da Justiça Desportiva, unidades autônomas e independentes das entidades de administração do desporto de cada sistema, compete processar e julgar, em última instância, as questões de descumprimento de normas relativas à disciplina e às competições desportivas, sempre assegurada a ampla defesa e o contraditório. Álvaro de Melo Filho, O Desporto na Ordem Jurídico-Constitucional Brasileira, São Paulo, Malheiros, p. 169
  8. E o inquérito policial? Seria caso de processo administrativo inquisitivo que tem a finalidade de aparelhar o Ministério Publico para que possa, eventualmente, promover ação judicial civil e penal. Não se destina a aplicação de sanção, mas configurariam procedimentos preparatórios, nesse sentido Fernando da Costa Tourinho Filho, Processo Penal, São Paulo, 11ª ed., 1º vol., p. 51 e Lourival Gonçalves Oliveira, Inquérito Policial, REPRO, 17 p. 155. Na mesma linha a proibição de falar nos autos da ação principal até a purgação do atentado (art. 881, CPC), efeito da sentença de procedência do pedido que atua como medida destinada a fazer com que o inovador prefira desfazer o ato ilegal a sofrer as consequências de não poder manifestar-se nos autos principais, constituir-se-ia ofensa ao contraditório. Nesse sentido, é interessante mencionar Acórdão da 1ª Câmara do Tribunal de Alçada de São Paulo, publicado na RT 549 (1981) 119 adverte: “A limitação de ordem legal tem em vista, precisamente, o tratamento paritário das partes, a fim de impedir que certos expedientes maliciosos sejam usados pelos litigantes com o fito de obter proveito indevido no curso da demanda.” (…) “subsiste a interdição imposta aos réus de se manifestarem no processo principal, inclusive na esfera recursal, sem que isto signifique afronta aos princípios constitucionais da plenitude de defesa e do contraditório.”
  9. Nelson Nery Jr., ob. cit., p. 132.
  10. Como lembra Cândido Dinamarco, Execução Civil, 4ª ed., revista, atualizada e ampliada. São Paulo, Malheiros, p. 170, O juiz é seguidamente chamado a proferir juízos de valor no processo de execução, seja acerca dos pressupostos processuais, condições da ação ou dos pressupostos específicos dos diversos atos levados ou a levar a efeito.
  11. Cândido Rangel Dinamarco, Execução Civil, 4ª ed., revista, atualizada e ampliada, São Paulo, Malheiros, p. 164. Não é legítimo sacrificar o patrimônio do devedor mais do que o indispensável para satisfazer o direito do credor. Se assim se pretende, é fundamental a outorga de faculdades e poderes ao executado na relação processual executiva e razão pela qual se afirma a própria existência da relação processual na execução forçada. Ainda, o mesmo autor noticia que a doutrina tradicionalista revela acentuada tendência a negar a presença do princípio do contraditório na execução, ou a ver nesta apenas um contraditório eventual. Fato é que sem a existência do contraditório não se poderá estabelecer o indispensável equilíbrio entre a exigência de satisfação do credor e a de respeito ao devedor e seu patrimônio.
  12. Nelson Nery Júnior, Princípios do Processo Civil na Constituição Federal, São Paulo, RT, 4ª ed., 1997, p. 138. Na mesma linha Luiz Fux, Tutela de Segurança e Tutela da Evidência (Fundamentos da Tutela Antecipada), São Paulo, Saraiva, 1996, quando reconhece que não pode o juiz sacrificar o interesse maior da justiça em prol do interesse subjacente particular de ouvir a parte antes de decidir. O segredo é o sucesso do provimento de segurança (…) esse rompimento tênue do contraditório não permite que se afirme sua abolição nas ações de segurança, tanto mais que o processo não transcorre de forma unilateral, manifestando-se o requerido após a atuação do juízo. Na verdade, o contraditório fica postergado a uma fase processual posterior.
  13. Colesanti, Vittorio, ob. cit., p. 601.
  14. José Carlos Barbosa Moreira, “A garantia do contraditório na atividade de instrução”, REPRO, 35, p. 234.
  15. Carlos Alberto Álvaro de Oliveira, “O Juiz e o Princípio do Contraditório”, REPRO 73, p. 7 segs.
  16. Michele Taruffo, La Prova dei Fatti Giuridici, Milano, Giuffrè, 1992, Vol. III, t. 2, p. 408.
  17. Michele Taruffo, ob. cit, p. 404.
  18. Michele Taruffo, obra citada, p. 405, “Per altro verso, e con riferimento a qualunque mezzo di prova, il contraddittorio delle parti rispetto alla valutazione delle prove serve specificamente some strumento di controlo dei poteri discrezionali del guidice, in quanto consente alle parti di indicare i criteri secondo i quali tali poteri dovrebbero essere esercitati, e comunque di svolgere preventivamente argomentazioni difensive al riguardo.
  19. Guiseppe Tarzia, Parità delle armi tra parti e poteri del giudice nel processo civile, em Problemi del processo civile di cognizione, Padova, Cedam, 1989, p. 311-320.
  20. Lembra Eduardo Couture, Fundamentos del Derecho Procesal Civil, Aniceto Lopez Editor, Buenos Aires, 1942, p. 106. que os fatos admitidos ficam fora do contraditório e como consequência natural fora da prova. “Es necesario ver que esta formula, una aplicación del principio del economia procesal, que induce a realizar los fines del juicio com el minimo de actos. (…) Imponer la prueba de todos los hechos, aún los aceptados tácitamento por el adversário, representaria exigir un inútil dipendio de energia contrario a los fines del processo.
  21. Releva salientar que perícias como o exame de corpo de delito, a perícia complementar e o exame do local do crime, que tem natureza cautelar e visam assegurar o resultado da prova, ainda na primeira fase da persecução criminal, ou seja no inquérito policial, são verdadeiras antecipações de provas, visando assegurá-la diante do grave perigo de dispersão dos elementos probatórios, mais grave ainda em direito criminal, em face da distinção entre os atos permanentes e os fatos transeuntes. O perigo na demora e a fumação do bom direito autorizam e exigem a antecipação destas provas, ad perpetuam rei memoriam. Mesmo em relação a estas cautelas, não se pode olvidar que o princípio do contraditório simplesmente esta deslocado para momentos sucessivos. Do contrário, a perícia há de ser produzida judicialmente perante o juiz da causa e banhado no contraditório prévio.
  22. Michele Taruffo, obra citada, p. 406 ” (…) la valutazione della prova implica che l’efficacia che ad essa viene attribuita dipenda da una scelta discrezionale del guidice, e questa schelta implica il rischio che la discrezionalità degeneri in arbítrio. Ai riguardo, dunque, vi à sempre la necessità di ammettere che le parti possano previamente interloquire avanzando e giustificando le proprie ipotesi, tendenzialmente diverse e contrastanti, giustificando le proprie ipotesi, tendenzialmente diverse e contrastanti, sull’efficacia da attribuire alle prove ai fini dell’acertamento del fatto. Il guidice non è obviamente vincolato ad alcuna di queste ipotesi, e neppure è costretto a scegliere soltanto entro le possibilità prospetate dalle parti; tuttavia le ipotesi indicate dalle parti possono costituire elementi di giudizio proprio in quanto mettono in evidenza possibilità diverse di decisione, nonché i relativi punti di sostengo e di critica. In questo senso, soprattutto, il prévio contraddittorio delle parti sulle ipotesi di valuttazione delle prove può essere im rilevante fattore di razionalizzacione e di controllo preventivo della discrizionalità del giudice.
  23. Ao que nos parece, a idéia é presente na sistemática da doutrina anglo-saxônica especificamente no Right to notice (direito de ciência da demanda). Nessa matéria, é interessante destacar Walther Habscheid, obra citada, p. 140, ao mencionar uma decisão do Bundesverfassungsgericht (Corte Constitucional Federal), definindo o direito de ser ouvido como o dever do tribunal de não utilizar na sua decisão senão os fatos e provas sobre as quais as partes puderam tomar posição anteriormente, a saber, em nosso contexto, dos quais elas puderam ter tido conhecimento.
  24. Carlos Alberto Álvaro de Oliveira, O Juiz e o Princípio do Contraditório, REPRO, 73, p. 07 segs. Nessa linha, o Código Processual de Portugal, apresenta a idéia do dever de consulta: Segundo Miguel Teixera de Souza. O dever de consulta é um dever de caráter assistencial do tribunal perante as partes. Este dever encontra-se estabelecido no art. 3º, nº 3: salvo no caso de manifesta desnecessidade, o tribunal não pode decidir uma questão de direito ou de fato, mesmo que seja de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de se pronunciarem sobre ela. O escopo deste preceito é evitar as chamadas “decisões surpresas”, isto é, as decisões proferidas sobre a matéria de conhecimento oficioso sem a sua prévia discussão pelas partes. Este dever de consulta mantém-se durante toda a tramitação da causa. Assim, se, por exemplo, o Supremo entender que a decisão de fato proferida pelas instâncias é insuficiente para permitir a aplicação do regime jurídico que considera aplicável ao caso, esse tribunal deve ouvir as partes antes de definir o novo enquadramento jurídico da questão sub iudice.
  25. Nelson Nery Júnior, ob. cit, p. 168 e seguintes.
  26. Carlos Alberto Álvaro de Oliveira, O Juiz e o Princípio do Contraditório, REPRO, 73, p. 07 segs.
  27. Carlos Alberto Álvaro de Oliveira, O Juiz o Princípio do Contraditório, REPRO 73, p. 12. Miguel Teixeira do Souza, obra citada. No Código Processual Português, o princípio da cooperação também se manifesta na posição recíproca de qualquer dos sujeitos processuais perante todos os demais. Assim, por exemplo, todos os intervenientes no processo devem agir em conformidade com um dever de correção e de urbanidade. O princípio da cooperação determina, como se viu, a imposição ao tribunal, além de um dever de auxílio, dos deveres de esclarecimento, de concepção dialética e retórica do processo, perde-se o seu caráter “dialógico”, torna-se prevalecente o processo escrito e aumenta a importância das provas pré constituídas e legais e, consequentemente, diminui a relevância das provas constituendas e livres. (…) A comparticipação das partes e a cooperação recíproca entre o tribunal e as partes são valores que substituem, com vantagem, a oposição e o confronto.
  28. Carlos Alberto Álvaro de Oliveira, O Juiz e o Princípio do Contraditório, REPRO, 73, p. 13.
  29. Esta idéia encontra-se bem presente na reforma do Código de Processo Civil Português, conforme José Lebre de Freitas, La Riforma Portoghese del Processo Civile, Rivista di Diritto Processuale Civile, Ano LII, Lugio-Settembre, N.3, CEDAN, p. 914, onde esta inclusa la proibizione delle decisioni a sorpresa.
  30. Carlos Alberto Álvaro de Oliveira, Do Formalismo no Processo Civil, São Paulo, Saraiva, 1997, p. 114.
  31. Joaquim José Calmon de Passos, Democracia, Participação e Processo, em Participação e Processo, coordenação de Ada Pelegrini Grinover, Cândido Rangel Dinamarco, Kazuo Watanabe, São Paulo, RT, p. 98. “A tarefa de hoje é política, ainda que pensada por juristas processualistas, responsáveis por teorizar sobre as instituições que compatibilizam as construções jurídicas com a realidade social, econômica e política de nossos dias, tendo em vista a efetivação das soluções transitórias de compromisso, as únicas possíveis de ser oferecida pela ordem jurídica formal.”
  32. Luigi Paolo Comoglio, Difesa e Contraddittorio nei Procedimenti in Camera di Consiglio, cit, p. 746, aponta que em homenagem ao princípio do contraditório, deve-se observar a) la garanzie del contraddittorio orale e dell’audizione delle parti, prima della pronuncia della decisione definitiva, purché siano comunque disponibili mezzi successivi di tuttela piena ed il contraddittorio posticipato sia imposto da esigenze prioritarie nell’economia del processo, le quali potrebbero altrimenti essere vanificate. b) la presenza fisica della parte, in un aperto e pieno contradittorio, con le garanzie di oralità che sono tipiche della pubblica udienza. c) la libera disponilità di eccezioni e difese, senza alcuna preclusione derivante dalla fase o grado del guidizio. d) l’obbligatorietà della difesa técnica per mezzo di un procuratore legale o di un avvocato, purché siano constantemente assicurate alla parte l’oportunità e la libertà di munirsi di un difensore di propria scelta.
  33. Nicolò Trocker, obra citada, p. 367 e seguintes, lembra que na Alemanha, o rechtliches Gehör, evoca o princípio da participação na Itália. Art. 103, 1º, da Lei Fundamental de Bom estabelece o direito de qualquer cidadão ser ouvido em juízo (vor Gericht hat jedermann Anspruch auf rechtliches Gehör) “Atraverso un’analisi teleologico sistemática, la parte migliore della dottrina e della giurisprudenz tedesche ha connesso l’esigenze di fondo del rechtliches Gehör al principio di partecipazione“.
  34. No novo Código de Processo Civil de Portugal, Miguel Teixeira de Souza, o tribunal tem o dever de auxiliar as partes na superação das eventuais dificuldades que impeçam o exercício dos direitos ou faculdades ou o cumprimento de ônus ou deveres processuais. Assim, sempre que alguma das partes alegue justificadamente dificuldade séria em obter documento ou informação que condicione o eficaz exercício de uma faculdade ou o cumprimento de um ônus ou dever processual, o juiz deve, sempre que possível, providenciar pela remoção do obstáculo.
  35. Miguel Teixeira de Souza, ob. cit., menciona no novo diploma adjetivo de Portugal, o dever de prevenção que é um dever do tribunal perante as partes com uma finalidade assistencial, pelo que não implica qualquer dever recíproco das partes perante o tribunal. O dever de prevenção tem uma consagração no convite ao aperfeiçoamento pelas partes de seus articulados (508º, nº 1, al. b, c) ou das conclusões das suas alegações de recurso (arts. 690º, e 701º, n 1). Aquele primeiro convite deve ser promovido pelo tribunal sempre que o articulado enferme de irregularidades ou mostre insuficiências ou imprecisões na matéria de fato alegada. Mas o dever de prevenção tem um âmbito mais amplo: ele vale genericamente para todas as situações em que o êxito da acção a favor de qualquer das partes possa ser frustrado pelo uso inadequado do processo. São quatro as áreas fundamentais em que a chamada de atenção decorrente do dever de prevenção se justifica: a explicitação de pedidos pouco claros, o caráter lacunar da exposição dos fatos relevantes, a necessidade de adequar o pedido formulado e a sugestão de uma certa atuação.
  36. Tanto é verdade o que se assevera, que no processo penal, se exige defesa técnica substancial do réu, ainda que revel (art. 261, CPP), para que se tenha por obedecido o mandamento constitucional. Para isso a norma é completada pelo art. 497, V, CPP, que manda seja dado defensor ao réu, quando o juiz o considerar indefeso, isso ocorre em homenagem ao princípio do contraditório conjugado ao da ampla defesa, ambos garantidos pela Constituição. No processo civil o contraditório não tem essa amplitude. É suficiente que seja dada oportunidade aos litigantes para se fazerem ouvir no processo, por meio do contraditório recíproco, da paridade de tratamento e da liberdade de discussão da causa. Tratando-se de direitos disponíveis, o réu, por exemplo, pode deixar de apresentar contestação — ocorrendo o fenômeno da revelia -sem que isto configure ofensa ao princípio do contraditório.
  37. A legislação mais recente vem acrescentando algumas formas por meios das quais se tem feito com que as desigualdades das partes (social, econômica, etc.) seja atenuada por certos “subterfúgios, certos “expedientes”do próprio direito positivo, de modo que o processo possa ter de fato uma função social, como, por exemplo, a inversão do ônus da prova no Código de Defesa do Consumidor e as próprias ações coletivas que favorecem os mais fracos, assim como o Direito Tributário encontramos no art. 112, no CTN, que indica dever fazer-se a interpretação mais favorável ao acusado em determinadas situações que a legislação tributária gere dúvida. Consuelo Salamacha, REPRO 73 (149-150). Fato é que no Processo do Trabalho, respeitáveis opiniões defendem a permanência do jus postulandi, inexistindo o pressuposto processual de capacidade postulatória. Isso estaria justificado a teor do art. 839, da CLT, in verbis: “A reclamação poderá ser apresentada: a) pelos empregados e empregadores, pessoalmente, ou por seus representantes e pelos sindicatos de classe; b) por intermédio das Procuradorias Regionais do Trabalho.” Mas a indagação a ser feita é: Como assegurar efetividade ao contraditório e a ampla defesa, princípios constitucionalmente insculpidos, não estando a parte assistida por defesa técnica? Ainda mais considerando a própria complexidade dos procedimentos e do próprio direito material. Ora, sendo o advogado indispensável à administração da Justiça (art. 133, CF e Lei nº 8.906, de 04.07.94, Estatuto da Advocacia e da OAB), sob as luzes da Carta Maior de 1988, não se há de admitir, na ausência do advogado, a existência de plenitude no contraditório.
  38. Nesse sentido é art. 6º da Convenção Européia dos Direitos do Homem, que garante expressamente ao acusado “o direito de dispor do tempo e das facilidades necessárias à preparação de sua defesa.
  39. Dentro de uma nova perspectiva ao Princípio do Contraditório essencialmente com tutela do. mais amplo direito de defesa – acentuando-se cada vez mais o direito de colaboração das partes com o órgão judicial e prévia discussão pelas partes da matéria objeto do litígio — Soveral Martins, Direito Processual Civil, Coimbra, Fora do Texto, p. 172, apresenta algumas idéias concretizadas no Código de Processo Civil do Portugal, como: a) a eliminação do efeito cominatório pleno b) a fixação de uma maior margem de flexibilidade da presunção de que a citação foi conhecida pelo seu destinatário e, nomeadamente, a de alargamento da tipologia dos casos de falta desse acto de secretaria c) a possibilidade, nos casos de regular citação seguida de revelia do réu, da possibilidade de este vir, supervenientemente, deduzir oposição ou recurso de revisão, sempre que a falta de contraditório tenha ocasionado injustiça grave d) a da atenuação do excessivo rigor formal do ônus de impugnação especificada Nomeadamente dispensando-se do cumprimento de tal ônus à parte que não litigue com patrocínio judiciário e) a da flexibilização do conceito de justo impedimento f) a da ampliação razoável dos prazos fundamentais que condicionem a prática de actos que exijam maior análise, ponderação ou investigação pela parte ou seu mandatário; g) a da consagração ou expedição oficiosa pela secretaria de um aviso registrado à parte alertando-a para o desencadeamento de efeitos preclusivos ou cominatórios graves h) a da admissão da apresentação de provas em momento ulterior ao previsto no art. 521º.
  40. Assim, respeitáveis opiniões defendem a permanência do jus postulandi, inexistindo o pressuposto processual de capacidade postulatória. Isso estaria justificado a teor do art. 839, da CLT.