Controle de Jornada Externa: O Ônus da Prova é do Empregador
Controle de Jornada Externa: O Ônus da Prova é do Empregador
O Tribunal Superior do Trabalho estabeleceu em 2025 importante precedente sobre trabalhadores externos. Através de tese vinculante, fixou-se que cabe ao empregador o ônus de provar a impossibilidade de controle da jornada externa. A decisão, proferida no processo RRAg-0000113-77.2023.5.05.0035, resolve divergência histórica sobre a aplicação do artigo 62, inciso I, da CLT e seus reflexos no direito a horas extras.
A Tese Fixada
“A impossibilidade de controle da jornada externa de trabalho constitui fato impeditivo do direito às horas extras, cabendo ao empregador o ônus de comprová-la para enquadramento na exceção prevista no art. 62, I, da CLT.”
O Contexto da Decisão
O artigo 62, inciso I, da CLT exclui do regime de controle de jornada empregados que exercem atividade externa incompatível com fixação de horário. Historicamente, empresas aplicavam amplamente essa exceção a vendedores, motoristas, técnicos de campo e outros profissionais externos, negando-lhes direito a horas extras.
A controvérsia residia na distribuição do ônus probatório. Muitos tribunais exigiam que o trabalhador provasse a possibilidade de controle, invertendo a lógica processual trabalhista. Outros já reconheciam que, sendo exceção à regra geral de limitação de jornada, caberia ao empregador demonstrar o enquadramento.
A tese vinculante consolida entendimento favorável ao trabalhador. A regra é o direito à jornada limitada e horas extras. O trabalho externo sem controle é exceção que deve ser cabalmente demonstrada por quem a alega, no caso, o empregador.
Alcance e Aplicação
A decisão alcança todos os trabalhadores formalmente classificados como externos: vendedores, motoristas de entregas, instaladores, técnicos de manutenção, auditores, consultores e similares. Não basta a natureza externa da atividade; é necessário demonstrar a impossibilidade efetiva de controle.
A evolução tecnológica tornou cada vez mais difícil sustentar a impossibilidade de controle. Smartphones com GPS, aplicativos de roteirização, sistemas de check-in em clientes e plataformas de gestão remota permitem monitoramento preciso da jornada, mesmo para trabalhadores dispersos geograficamente.
Elementos que evidenciam possibilidade de controle incluem: roteiros predefinidos, metas diárias de visitas, relatórios de atividades, participação em reuniões fixas, atendimento a chamados em horários específicos e uso de tecnologia de rastreamento. A presença de qualquer desses elementos fragiliza a tese de impossibilidade de controle.
Impactos na Gestão de Equipes Externas
Para empresas com forças de vendas ou equipes técnicas externas, a decisão impõe revisão completa de práticas. Estima-se que existam três milhões de trabalhadores classificados como externos no Brasil. Se parcela significativa passar a ter direito a horas extras, o impacto financeiro setorial pode alcançar bilhões.
Empresas de telecomunicações, distribuidoras de bebidas, laboratórios farmacêuticos e seguradoras são especialmente afetadas. Seus modelos de negócio frequentemente dependem de equipes externas trabalhando além da oitava hora diária, agora sujeitas a remuneração extraordinária.
A alternativa de efetivamente abrir mão do controle – permitindo que trabalhadores determinem livremente seus horários – esbarra em necessidades operacionais. Clientes esperam atendimento em horários comerciais, reuniões demandam sincronização de equipes e metas pressupõem dedicação temporal mínima.
Questões Práticas Relevantes
Para sustentar a exceção do artigo 62, empresas devem documentar minuciosamente a autonomia concedida ao trabalhador. Contratos devem explicitar a liberdade de horários, ausência de roteiros obrigatórios e flexibilidade total de agenda. Qualquer elemento de controle, mesmo indireto, compromete o enquadramento.
Trabalhadores beneficiam-se da presunção de jornada controlada. Na petição inicial, basta alegar realização de sobrejornada. Caberá à empresa, em contestação, provar a impossibilidade de controle. Registros de ligações, mensagens fora do expediente, emails com timestamp e relatórios de GPS são provas valiosas da possibilidade de aferição de horários.
A negociação coletiva não pode validar enquadramento artificial no artigo 62. Acordos que declaram impossibilidade de controle quando esta efetivamente existe são nulos por violarem norma de ordem pública. A limitação de jornada é direito fundamental que não comporta renúncia genérica.
O momento de avaliação é dinâmico. Empresa que implementa nova tecnologia de gestão pode perder o direito à exceção, mesmo que historicamente não houvesse controle. Trabalhadores atentos a mudanças tecnológicas podem questionar enquadramentos anteriormente válidos.
