Pejotização: Suspensão de Ações pelo STF, Impactos Arrecadatórios e Jurisprudência Atual

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08 de maio de 2025

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A prática da pejotização – contratação de trabalhadores como pessoas jurídicas em substituição ao vínculo empregatício – ganhou novos contornos com a recente decisão do Supremo Tribunal Federal que suspendeu todos os processos sobre o tema no país. Esta medida, de grande impacto para o mercado de trabalho brasileiro, reacende debates sobre os limites entre a liberdade de contratação e a proteção dos direitos trabalhistas.

A Suspensão Nacional dos Processos sobre Pejotização pelo STF

Em abril de 2025, o ministro Gilmar Mendes determinou o sobrestamento de todos os processos que tratam do reconhecimento de vínculo empregatício decorrente da contratação por pessoa jurídica. A decisão foi tomada no âmbito do Tema 1.389 de repercussão geral, que discutirá a competência da Justiça do Trabalho para julgar a legalidade dos contratos de prestação de serviço firmados entre pessoas jurídicas.

Esta decisão representa uma das mais significativas movimentações do Supremo nos últimos anos, com potencial para redefinir os contornos da atuação da Justiça do Trabalho. A suspensão visa uniformizar o entendimento sobre o tema e impedir a multiplicação de decisões divergentes, enquanto o STF não julga definitivamente a matéria.

Esta medida ocorre em um contexto de crescente divergência entre o Supremo e a Justiça do Trabalho. Enquanto o STF tem adotado um entendimento mais flexível sobre formas alternativas de contratação, a Justiça do Trabalho frequentemente mantém uma postura mais conservadora, baseada na presunção da hipossuficiência do trabalhador.

Impactos Arrecadatórios da Pejotização no Brasil

Um aspecto frequentemente negligenciado no debate sobre a pejotização são seus impactos sobre a arrecadação tributária e previdenciária. Segundo estudo técnico elaborado pelos economistas Nelson Marconi e Marco Capraro Brancher, a substituição do regime celetista pela contratação via pessoa jurídica gera significativa redução na arrecadação de tributos.

Os dados são alarmantes:

  • Entre 2018 e 2023, estima-se que o Fisco deixou de arrecadar cerca de 144 bilhões de reais devido à pejotização
  • Para o FGTS, mais de 15 bilhões de reais deixaram de ser recolhidos no mesmo período
  • Isso representa uma perda de mais de 40% da arrecadação para o Fundo em 2023
  • Caso metade dos trabalhadores celetistas atuais fossem convertidos em PJs, a perda anual de arrecadação chegaria a 384 bilhões de reais
  • Este valor equivale a 16,6% da arrecadação federal de 2023

Esta redução arrecadatória ocorre porque a carga tributária que incide sobre um trabalhador celetista é significativamente maior do que aquela aplicada a um prestador de serviços PJ, especialmente quando enquadrado como MEI ou optante pelo Simples Nacional. Em 2023, enquanto a arrecadação média gerada por um trabalhador celetista foi de cerca de 25 mil reais, a de um trabalhador por conta própria formal foi de apenas 1,6 mil reais.

A Jurisprudência do TST sobre Pejotização

A análise da jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho revela um cenário complexo. Por um lado, o TST tem reconhecido a licitude da terceirização, inclusive em atividades-fim, baseando-se nos precedentes do STF (ADPF 324 e RE 958.252-MG). Por outro lado, continua identificando casos de fraude quando verificados os elementos caracterizadores do vínculo empregatício.

O TST tem mantido o entendimento de que, apesar da licitude da terceirização, a “pejotização” pode configurar fraude às relações trabalhistas quando presentes os requisitos do artigo 3º da CLT:

  1. Subordinação
  2. Pessoalidade
  3. Habitualidade
  4. Onerosidade

Nestes casos, o tribunal tem reconhecido o vínculo de emprego, como demonstrado em diversas decisões recentes.

Um aspecto importante da jurisprudência do TST é a aplicação da Súmula 126, que impede a reavaliação de provas em instância extraordinária. Isso significa que, quando instâncias inferiores reconhecem o vínculo empregatício com base nas provas apresentadas, o TST tende a manter essas decisões.

Em casos como o processo TST 0100418-53.2020.5.01.0078, o tribunal reconheceu que “a contratação de trabalhador por meio de pessoa jurídica constituída especificamente para esse fim, quando presentes os requisitos da relação de emprego, configura fraude aos preceitos trabalhistas, nos termos do art. 9º da CLT“.

Quando a Pejotização é Considerada Fraude Trabalhista?

A pejotização é considerada fraude trabalhista quando, apesar da formalização como prestação de serviços entre pessoas jurídicas, a relação apresenta características típicas de vínculo empregatício:

  • Subordinação: o trabalhador está sujeito a ordens, controle e fiscalização
  • Pessoalidade: o serviço deve ser prestado pessoalmente pelo contratado, sem possibilidade de substituição
  • Habitualidade: o trabalho é contínuo e regular, não eventual
  • Onerosidade: há remuneração pelo trabalho prestado

Quando estes elementos estão presentes, os tribunais têm entendido que há uma tentativa de mascarar uma relação de emprego, aplicando o artigo 9º da CLT, que considera nulos os atos praticados com o objetivo de desvirtuar ou impedir a aplicação dos preceitos trabalhistas.

Perspectivas Futuras para a Pejotização no Brasil

A decisão do STF de suspender os processos sobre pejotização sinaliza que estamos em um momento de redefinição dos limites entre a liberdade de contratação e a proteção dos direitos trabalhistas. O julgamento do Tema 1.389 poderá estabelecer parâmetros mais claros sobre quando a contratação via pessoa jurídica é legítima e quando configura fraude.

Enquanto isso, empresas e trabalhadores permanecem em um cenário de insegurança jurídica. Para as empresas, é fundamental avaliar cuidadosamente os contratos de prestação de serviços, evitando elementos que caracterizem subordinação, pessoalidade, habitualidade e onerosidade. Para os trabalhadores, é importante compreender que a opção pelo regime PJ implica na renúncia a direitos trabalhistas e previdenciários garantidos pela CLT.

Conclusão: O Futuro da Pejotização após a Decisão do STF

A pejotização representa um dos temas mais controversos do direito do trabalho contemporâneo. Se por um lado oferece flexibilidade e potencial redução de custos, por outro pode significar precarização das relações trabalhistas e impactos negativos sobre a arrecadação tributária e previdenciária.

A suspensão dos processos pelo STF oferece uma oportunidade para que o Judiciário estabeleça critérios mais claros e uniformes sobre o tema. Enquanto aguardamos essa definição, é fundamental que empresas e trabalhadores compreendam os riscos e consequências de suas escolhas contratuais. O equilíbrio entre a modernização das relações de trabalho e a preservação de direitos fundamentais permanece como o grande desafio a ser enfrentado pelo sistema jurídico brasileiro nos próximos anos.

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